Wednesday, November 19, 2008

Wolf Creek, de Greg McLean



Informados logo à cabeça de que 90% das pessoas perdidas na Austrália nunca são encontradas, a nossa atenção é reduzida a três jovens turistas num carro alugado, que percorrem as capelinhas dos seus monumentos naturais. Se juntarmos as duas pistas, percebemos que vão perder-se e só têm 10% de hipóteses de serem encontrados.

Apresentando-se como um filme de terror em que três jovens são atacados por um psicopata assassino na vastidão do território oeste australiano, o resultado é um desequilibrado e inútil exercício à paciência e persistência da plateia. Paciência com a lentidão da história (uma hora de turismo por estradas interiores e cenários desinteressantes, servidas por diálogos pouco inspirados entre um rapaz e duas raparigas num carro alugado) e meia hora de um suspense pouco sustentado e nenhuma originalidade narrativa. Os momentos de sadismo e gore são poucos e mal aproveitados, o jogo de gato e de rato e perseguição é demasiado curto e o vilão demasiado omnipresente.

A primeira hora do filme é despendida entre áridas e inóspitas paisagens que lembram as de inúmeros filmes americanos do género – e muito mais bem conseguidos – desde “Terror na Auto-estrada” a “Jeepers Creepers”, passando por aquele que parece ter sido a pedra de toque de Greg McLean: “O Massacre no Texas”, de Tobe Hooper.

Mas essa foi árvore que já esgotou o fruto. O Massacre original data de 1974 e desde aí já teve três sequelas (a terceira das quais com Mathew McConnaughey e René Zellweger – mas não se equivoquem, é um barrete a evitar!), um remake (a estreia de Michael Bay como produtor, uma pequena pérola realizada por Marcus Nispel) e uma prequela, neste momento em filmagens (com um argumento igualzinho ao original e às sequelas, com um grupo de jovens a meter-se com a família Hewitt e a serem... adivinharam bem... massacrados).

Um “Massacre no Texas” feito na Austrália, com proveniência diferente, mas resultado igual a dezenas que deixam os estúdios americanos por ano e vão directos para DVD ou deitados fora. Só não se chama “Massacre em Wolf Creek” porque as vítimas são demasiado poucas para se usar a palavra «massacre». O local existe mesmo, no oeste australiano, mas é uma cratera provocada por um meteorito e não um riacho (=creek).

Filme desequilibrado, já que uma hora de paisagismo nunca seria compensada por meia hora de terror, a menos que estivéssemos perante um trabalho de génio. Desenganem-se os que ainda não tiverem percebido. O acima mencionado «terror» nunca chega a acontecer e ficamo-nos pela mera expectativa, a qual sai constantemente gorada (e as oportunidades não são muitas).

Agora vou revelar alguns dados manhosos, que só devem ler depois de verem o filme, ou se não se ralarem. Eu recomendo a leitura. A credibilidade da história é deitada às urtigas quando o vilão se transforma em superhomem. Leva um tiro no pescoço que sangra pouco, cinco minutos depois já está recomposto. Anda, fala, conduz e dispara certeiro, em vez de se esvair em sangue. Os três jovens são drogados e a mais corajosa acorda amarrada numa cabana, passou-se um dia inteiro e ele não fez nada. A outra jovem parece ter sido muito torturada, mas afinal só tem o nariz partido (o sangue na cara e na roupa é em resultado disso), o resto é garganta. A fuga delas na carrinha do vilão é ridícula, já que deitam o veículo de uma ribanceira assim que notam que estão a ser perseguidas e voltam para a toca do lobo a pé – e chegam lá rapidamente, por isso não foram longe. A mais corajosa e inteligente só lá foi à procura de um carro para fugir e das chaves da ignição, mas perde tempo a ver as recordações que o vilão tirou a vítimas anteriores e este regressa, do nada, sem som (como não podia deixar de ser), para acabar com ela – isto é o “Halloween”? Carpenter, volta, ‘tás aperdoado, filho! A outra jovem foge durante um dia e uma noite inteiros e vai dar a uma auto-estrada onde pede boleia, mas o vilão aparece do nada e é mortal (como é que ele sabia o exacto sítio da estrada onde ela ia aparecer só o realizador, que também é o argumentista, sabe; claro, mais ninguém se dignaria a realizar tamanha idiotice senão o autor do argumento). O rapaz acorda só no final do filme, foge e é salvo. Mas nem se deu ao trabalho de procurar as companheiras de viagem, nem por cinco minutos; nós sabemos que elas estão mortas, mas ele não! E também não se percebe como é que ele fica inconsciente mais vinte e quatro horas do que elas. Nem se percebe como o vilão não o apanhou a meio da fuga, já que com as miúdas parecia saber sempre onde estavam – se calhar já não havia fita para continuar as filmagens (os produtores devem ter-se assustado com o que viram)...

Avisa o filme que se baseia em factos verídicos. Mas como as duas protagonistas morrem assassinadas e o único sobrevivente não viu nada do que lhes aconteceu, a meia hora de «terror» é totalmente inventada. A única coisa que pode considerar-se provada (e isto acreditando-se no realizador, o que depois deste episódio de incompetência será pedir muito) é que nunca mais se viram as duas moças depois de um simpático local os ter ajudado num problema com o carro – nem sequer se pode dizer que esse simpático local foi o mesmo que as torturou, porque ninguém deu com o sítio da tortura nem com as vítimas da tortura, nem com o torturador. Por outras palavras, qual tortura?

Tentativa australiana de plagiar um tema de terror já muito visto, erra em todas as fases do projecto, começando pela originalidade e terminando na efectividade de instilar medo ou inquietação.

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