Monday, March 30, 2015

A Centopeia Humana 2, de Tom Six

Desta vez, a centopeia tem 40 patas e o cirurgião foi substituído por um porteiro de garagem anão, obeso e deficiente mental. O filme procura recriar o fenómeno da Centopeia Humana com 12 vítimas (duas não chegam a compor a sequência) e a promessa de mais sangue e fezes do que o primeiro. A preto e branco e praticamente sem história para além da colheita de vítimas e respectivo encarceramento, a sequela nem chega a ser grotesca, não obstante o seu enorme esforço por chocar para além do limite, ficando-se pelo facilitismo, aborrecimento e estupidez. A banda sonora é recheada de gritos e de sons intestinais, mas a maior parte da violência é offscreen.
Uma das maiores falhas de A Centopeia Humana: Primeira Sequência (2009) era a falta de credibilidade na concretização do plano cirúrgico, já que as vítimas se encontravam presas umas às outras por ligaduras e, quando se locomoviam, era evidente que as bocas e os ânus não estavam cosidos. Infelizmente, os efeitos visuais não melhoraram e, se desta vez o que prende as vítimas umas às outras é fita adesiva grossa, a mesma está lassa e provavelmente nem cola tem (se o problema era não colar o cabelo dos actores, teria sido mais acertado colocar-lhes perucas e apertar bem a fita-cola). Isto é penosamente óbvio na cena da orgia fecal, onde os excrementos explodem na cara dos de trás, o que não aconteceria se estivessem cosidos.
The Human Centípede 2: Full Sequence 2011

Tuesday, March 3, 2015

Jessabelle, de Kevin Greutert

Depois de fazer a montagem de cinco filmes da saga Saw (2004-2010), Kevin Greutert lá conseguiu saltar para trás da câmara e matar a galinha de ovos de ouro, fraco cartão de visita para Jessabelle, que não é o nome de uma boneca assassina (Annabelle, 2014), mas de uma loira que é assombrada por uma negra que toma banho em petróleo, só não sendo racista porque se passa no Louisiana, ou é racista na mesma, em complemento a ser simplesmente mau. Clichés atrás de clichés e nem um único susto. 
Como curiosidade, o guião integra cassetes de vídeo e possessão, o que lembra The Ring (2002) e The Ring 2 (2005) e expõe os responsáveis pelo design de produção como snobs: o quarto da mãe estava fechado desde que ela morrera duas décadas atrás (com um armário a tapar a porta, até), mas ninguém se preocupou em empoeirá-lo, ao ponto de haver uma imaculada caixa debaixo da cama (onde estão guardadas as cassetes de vídeo) e de tornar-se no quarto da filha sem ser aspirado ou arejado.
Jessabelle 2014

Nightcrawler - Repórter Na Noite, de Dan Gilroy

Um psicopata à procura de rumo encontra a solução na forma de uma câmara e, aliado à ávida directora de informação de uma cadeia televisiva local, rapidamente se transforma no mais activo repórter gráfico de acidentes e crimes violentos. Quando o momento se apresenta, ele não hesita em girá-lo a seu favor e, graças a Dan Gilroy, a opção foi a de rentabilizar uma situação pré-existente e não a de iniciá-la, o que teria sido muito fácil, óbvio e pouco original. Nightcrawler vale por um Jake Gyllenhall que nunca pisca os olhos e uma invulgarmente contemporânea banda sonora de James Newton Howard. E pelas frases «A friend is a gift you give yourself» e «It’s my Job; I like to say that, if you see me, you’re having the worst day of your life». É a primeira vez que o argumentista Dan Gilroy se senta atrás das câmaras (e logo com guião do próprio), ele que é marido de Rene Russo desde 1992, ano em que se cruzaram nos bastidores de Freejack (1992).
Nightcrawler 2014

Open Windows, de Nacho Vigalondo

Se Grand Piano (2013) é uma clara homenagem a Alfred Hitchcock, Open Windows (2014) inspira-se no seu discípulo Brian DePalma, especificamente em Body Double (1984). Um ingénuo é colocado na posição de mirone de um orquestrado acto sexual, através da sua janela, o qual poderá incluir homicídio. Reviravoltas mais tarde, o guião aproxima-se do de Nick of Time (1995), onde um ingénuo é coagido a assassinar um terceiro num evento controlado ao milímetro. Regressa a Body Double, com uma agressão mascarada na cama, faz uma curva para The Call – Chamada de Emergência (2013), com a vítima na bagageira a ser auxiliada através de um telefonema, outra para colar-se a Untraceable (2008), onde o número de utilizadores de internet a logarem-se a um site pode influenciar o desfecho de um crime e, por fim, I, Robot (2007) na maior desfaçatez possível.
O tributo a DePalma não está apenas relacionado com parte significativa da narrativa, mas igualmente pela apetência desse realizador em recorrer à tecnologia visual mais recente para distorcer, dividir e multifacetar a realidade (característica marcante em Carrie, de 1976, Snake Eyes, de 1998, e Mulher Fatal, de 2002). No caso de Open Windows, o recurso é feito, como o nome indica, através de um computador portátil com inúmeras janelas abertas, no mundo digital capazes de controlar câmaras, telemóveis, satélites e videoconferências. A confusão do protagonista é seguida através destas janelas, com que tem de lidar para perceber o imbróglio em que está, inadvertidamente, envolvido e para poder salvar a sua estrela de cinema favorita, que poderá ser vítima de um delito incapacitante se ele não for mais esperto do que o mastermind por trás do jogo de gato-e-de-rato a que foi sujeito.
Elijah Wood conclui aqui o que poderá designar-se como a sua trilogia thriller (Maníaco, Grand Piano e Open Windows), realizados por um francês e dois espanhóis, aqui o caso de Nacho Vigalondo, curiosamente o realizador de Os Cronocrimes (2007), para o qual Eugenio Mira (realizador de Grand Piano) contribuiu como compositor, sob o pseudónimo Chucky Namanera. O filme foi filmado com web cams em tempo real, para aumentar o seu realismo, presumindo-se duvidosamente que tenha sido rodado em apenas 100 minutos. Ainda que o conceito seja curioso, o facto de remeter a memória do cinéfilo para demasiados filmes anteriores elimina a originalidade, que o realizador julgaria garantir pelo recurso à tecnologia nas vertentes hacker, cyberstalking e cyberbullying. O desfecho da história, no meio de tantas pontas soltas, é tão descuidado que a desilusão é forçosamente inevitável. Cabe ainda referir Sasha Grey, a actriz pornográfica que Steven Soderbergh trouxe para o mainstream com The Girlfriend Experience (2009), aqui no papel com mais frases da sua carreira, ela que tem tido o nome associado a projectos de diminuta permanência, caso de Scribbler (2014), onde tem apenas uma frase antes de ser atirada do telhado de um prédio. Aqui, não merece tal destino e prova que é possível dar a volta por cima, leiam o seu romance erótico The Juliette Society, publicado em 2013, se não tiverem a certeza.
Open Windows 2014

Grand Piano, de Eugenio Mira

Um pianista com medo de tocar mal é coagido, sob ameaça de morte, a não errar uma única nota em todo o concerto, o qual inclui uma peça que é praticamente impossível de acertar, mas é a mais importante para quem tem o dedo no gatilho. O pianista dispõe até ao final do espectáculo para assegurar que nada lhe acontece ou à sua esposa, que assiste num camarote, e também deslindar o mistério em que está envolvido.
A trama é muito simples e o filme não tenta fazer dela mais do que aquilo que é, um sólido pedaço de entretenimento com aspirações a homenagem ao grande mestre Hitchcock. Eugenio Mira, que já interpretou um jovem Robert DeNiro em Red Lights (2012), de Rodrigo Cortes, é realizador e compositor, mas desta vez deixou a partitura ao cuidado de Victor Reyes e cingiu-se ao controlo da complicada mise-en-scéne da opera house. 
Desde que foi Frodo Baggins, Elijah Wood tem-se desdobrado em curtas metragens, vozes para séries de animação e videojogos, sem contar com a comédia televisiva Wilfred (2011-2014) e ainda trabalhos como DJ, mas poderá ter encontrado um nicho no thriller, onde conta já com o remake de Maníaco (2012), Grand Piano (2013) e Open Windows (2014) interpretando sempre o mesmo personagem com ocupações diferentes (tímido, confuso e titubeante). Kerry Bishé deixou uma boa impressão na minissérie Halt And Catch Fire, razão mais do que suficiente para ver tudo o que já fez, de Red State (2010) a Goodbye World (2013). John Cusack é o homem que fala ao ouvido do pianista, imaterial até ao clímax, onde perde para Kiefer Sutherland o prémio de mais tempo ausente (Cabina Telefónica, 2002). No genérico final, Patrick Godureaux surge como compositor da peça La Cinquette, mas esse nome é ficcional.
Grand Piano 2013

Livrai-nos Do Mal, de Scott Derrickson

Mistura de End of Days (1999) e RIPD (2013), começa com polícias e termina com demonólogos, porque das paredes entre os dois mundos abrem-se portas e janelas à custa de rabiscos e ladainhas em latim, exorcismos que intercalam inglês e castelhano e canções dos The Doors só por causa do nome da banda. Eric Bana não é Arnold Schwarzenegger, mas já foi o Hulk (2003), e Edgar Ramirez não é Jeff Bridges, mas vai ser Bodhi no remake de Point Break, o que não abona a favor de nenhum dos dois, nem de Livrai-nos Do Mal, que não passa de uma historieta de possessões sob a capa de falsas bases reais, com Joel McHale a estragar todas as cenas em que aparece e, aparentemente, treinou a arte de manejar facas durante meses, para depois ter apenas uma tímida e desastrada amostra das capacidades adquiridas.
Bófias de manga curta em noites de chuva intensa e um vilão de gorro que imita Nomak (Blade 2, 2004), espíritos que apagam lâmpadas mas não afectam lanternas, um herói que se acha o máximo mas soma atitudes estúpidas (entra no poço dos leões do zoo, mete o braço pelas grades de uma doente mental que gosta de morder, exige ao raptor que lhe revele onde estão as vítimas, mas agride-o repetidamente na cabeça, incapacitando-o), crucifixos com poderes sobrenaturais e hospedeiros malignos que levitam e abrem chagas, Christopher Young na banda sonora a não conseguir salvar coisa nenhuma. Scott Derrickson, o realizador, não tem um currículo famoso: Hellraiser: Inferno (2000), O Exorcismo de Emily Rose (2005) e O Dia Em Que A Terra Parou (2008) são três obras nulas, de que sobressai Sinistro (2012), onde o suspense é bem gerido até a história perder o fôlego, algo semelhante ao que ocorre aqui.
Deliver Us From Evil 2014

Ouija, de Stiles White

Quando uma jovem morre subitamente, a melhor amiga decide fazer uma séance com os amigos mais chegados, utilizando a tábua de ouija que nem sabia que a amiga tinha e cuja brincadeira não jogavam desde a infância. Porque, claro, a história não é para ser tomada a sério, é apenas uma forma do estúdio Platinum Dunes de Michael Bay promover um brinquedo da Hasbro, ele que tem uma tão grande dívida de gratidão para com os fabricantes dos Transformers.
Stiles White, ao estrear-se na realização e escrita a solo, ele que até aqui só tinha participado em pobreza a várias mãos (Boogeyman, Knowing e A Possessão), agora não pode repartir a incompetência com ninguém, tirando um elenco sem graça, encabeçado por Olívia Cooke, que já fazia de miúda sem graça na série Bates Motel. Robyn Lively, que encantou como Teen Witch em 1989, tem um pequeno papel no início.
Ouija 2014 

The Conjuring – A Evocação, de James Wan

Soalhos a ranger, portas movidas por correntes de ar e, voilá, estava criado um sub-género. Famosas pela sua arquitectura vitoriana, as casas assombradas têm assustado leitores desde os contos de fantasmas de M.R. James e já esgotaram o parque habitacional de Hollywood e do cinema independente mas, se sabemos alguma coisa do lobby da construção civil é que onde há espaço há esperança.
James Wan lançou a saga Saw (2004) e, desde então, tem-se mantido dentro dos espartilhos do sobrenatural, com Dead Silence (2007) e dois Insidious (2011-2013), mas prepara-se para deixar o ninho com Furious 7 (2015), onde os mortos não o largam, mas estiveram vivos até meio das filmagens. Apesar de Wan já contar alguns anos disto, The Conjuring é o seu primeiro trabalho sem falhas. Rodeado de actores de confiança (Patrick Wilson já vinha de Insidious, Lili Taylor já foi perseguida por um espírito em A Mansão, não há nada que Vera Farmiga não consiga fazer e Ron Livingston consegue fazer o que lhe mandam), o suspense é construído com tanto cuidado que, mesmo sem trazer nada de novo a sagas estafadas como Amityville – A Mansão do Diabo (1979), cumpre criteriosamente todos os requisitos pretendidos e o tempo é dado por bem empregue. 
O guião dos gémeos Chad e Carey Hayes também incorpora possessão demoníaca, juntando assim O Exorcista (1973) e um casal de demonólogos. E crianças que se queixam de frio à noite, mas dormem com os pés descalços. Em 2014, saiu uma falsa prequela, dedicada à boneca Annabelle, aqui só perifericamente relevante, realizada pelo director de fotografia de The Conjuring. Em comparação, não podia ser pior.
The Conjuring 2013

Annabelle, de John R. Leonetti

Barulhos, portas que se fecham sozinhas e uma boneca de porcelana que já é feia antes de ser possuída, com crescendos de violino a dificultarem a deglutição e uma mãe bonita por contraponto. Não é o filme para dominar todos os filmes de bonecos demoníacos, é apenas mais um produto estafado de uma onda de eterna reciclagem de clichés. Rosemary Baby, Amityville e Chucky é a mistura do que é apresentado como prequela de The Conjuring (2013), mas tudo o que tem em comum é a primeira sequência, a boneca (cuja importância é muito periférica nesse filme) e o director de fotografia John R. Leonetti, que agora assume a função de realizador, depois das experiências frustradas de Mortal Kombat: Anihilation (1997) e O Efeito Borboleta 2 (2006). No currículo, tem também a fotografia de Chucky 3 (1991), aquele onde o boneco diabólico resvalou do terror para a comédia involuntária.
Reconhece-se que a cena de possessão da boneca é uma interessante variação à origem de Chucky, ainda que mais tarde venha a desmentir-se que haja realmente possessão, o que é desconcertante (mas coerente com o que é relatado em The Conjuring). O resto, porém, não tem o menor impacto e nem a discreta beleza de Annabelle Wallis (a actriz, não a boneca) é suficiente para evitar o bocejo. Relativamente ao seu predecessor, Annabelle merecia ser uma edição directa para vídeo.
Annabelle 2014