Wednesday, November 19, 2008

Coisa Ruim, de Tiago Guedes e Frederico Serra


Antes de mais, cabe notar que, em termos plásticos, este filme está irrepreensível. Tratado-se de um projecto independente português, este factor revela-se de especial importância. Usualmente, as cenas nocturnas são mal iluminadas, o som é roufenho e as vozes ininteligíveis (“Alice”, de Marco Martins, datado de 2005, é um exemplo gritante). Aqui, a imagem e o som são fortes elementos de qualidade. Se o filme não fosse português, isto nem se mencionaria. Mea culpa...

“Coisa Ruim” passa-se no meio rural português e alimenta-se do folclore de meter medo, mas mantendo sempre a guarda levantada do cepticismo em relação ao tema, até ao clímax final. Esse cepticismo leva a que o filme nunca chegue a inquietar e o desfeho revela-se assim tão absurdo que torna risível todo o projecto (até “O Exorcismo de Emily Rose”, outro a beber do “Exorcista” original, conseguia reunir mais consenso).

A história de Rodrigo Guedes de Carvalho é banal. Pior do que banal, é uma estafada revisitação de mais de seis décadas de cinema de terror e estranha-se que, depois de absorver tantos filmes, a esponja não largue mais do que uma gota ou duas. É o milagre Fairy, ou da falta de originalidade?

Uma família urbana instala-se numa velha casa no campo (“Amityville”, minha gente) e descobre que antepassados seus foram responsáveis por um crime bárbaro que envolveu a violação e imolação de uma mulher e três crianças. A acção desenvolve-se lentamente e de modo solto, com diálogos entre párocos e agnósticos, pequenos relatos supersticiosos à mistura e sem esquecer um exorcismo e uma sessão espírita. Tenta-se criar a ideia de medo do desconhecido e do inexplicável, mas é aqui que inquina a construção. Fica-se pela intenção e a reacção ao susto é o bocejo.

Há muita coisa que fica por explicar e ajudava clarificar. Xavier (Adriano Luz), o pai de família, é a razão porque se mudam para o casarão na terrinha, e a ideia é mudarem de ares, mas só ele parece interessado nisso (a mulher e os filhos ainda não aderiram à ideia). Mas porque insiste ele tanto? Não se sabe. Talvez o tédio, o stress da cidade. Qual a profissão dele, como vão fazer para subsistirem, pois não parecem endinheirados? Xavier é biólogo, diz-se, e passeia pelos montes num jipe a ver paisagens, mas ver paisagens qualquer um vê... A mulher não trabalha e a filha adolescente, que já é mãe, não se sabe se estuda. Os três pastorinhos, que só o filho mais novo, Ricardo, vê (porquê ele?), são três miúdos imóveis à moda vitoriana (quem disse que as estátuas metem mais medo que os vivos?). Lena (Manuela Couto) ouve o marido chamá-la, mas ele afinal não está em casa – porque havia a alma penada de imitar-lhe a voz?)
O maior mérito do filme, antes de deitar tudo por terra com um clímax medonho, é manter a dúvida em relação aos fantasmas que vai apenas sugerindo. Praticamente até aí, poderia safar-se airosamente como um dos mais curiosos projectos do género, se desse o dito pelo não dito e os indícios de mistério não passassem de engodo. Mas afinal a encomenda era corriqueira e a previsibilidade da vingança vinda do além sabe a muito pouco.

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