Friday, August 17, 2012

A Serbian Film, de Srdjan Spasojevic



Depois da trilogia Hostel passar por Amesterdão (2005) e Eslováquia (2007) e antes de chegar, directamente para vídeo, a Las Vegas (2010), Srdjan Spasojevic trouxe o torture porn para a Sérvia natal, mas não soube o que fazer com ele. O argumento misturou snuff, pedofilia e até necrofilia, mas é tão plástico, encenado e tosco que é impossível levá-lo a sério.
O seu primeiro pecado é demorar a desenvolver. A curiosidade criada em torno de um filme mistério, para o qual um ex-actor porno é convidado a participar, por uma elevada quantia, não é suficiente e vai esmorecendo, tanto mais que os primeiros dias de filmagens são realmente entediantes. A desilusão não se fica por aqui: no reino da pornografia violenta, o filme envergonha-se. Tenta convencer o público de que é, ou vai ser, chocante, mas vacila ante a apresentação de um simples pénis, recorrendo a evidentes dildos de silicone, e até se esquece de juntar sangue à excisão de um. A cobardia, numa película que já pertencia à categoria M/18, não pode ser premiada.
Finalmente, o realizador entra em pânico e o filme torna-se surrealista, passando a depender de flashbacks e de todos os efeitos gráficos que vêm com a câmara. Sem que se perceber o que são alucinações, memórias ou presente, instala-se o desnorte e a confusão, com um lavar dos cestos que já nem pode considerar-se vindima e muitas respostas por esclarecer. Outras, porém, são tão previsíveis que se adivinham, como a identidade do violador encapuzado. No meio deste desperdício, fica o lamento de Um Filme Sérvio não trazer nada de novo.
Srpski Film 2010

Rec 3, de Paco Plaza



Os zombies são uma fonte de rendimento (ainda que não de inspiração) inesgotável e os espanhóis recusam-se a largar o osso. Assim como, ao cabo de dez minutos de filme, Ring 2 (2002) deitou fora a cassete assassina, [Rec 3] Genesis atira o conceito de vídeo caseiro às urtigas, passando para uma steadycam em menos de meia hora. Apesar da relativa originalidade de [Rec] (2007) assentar precisamente nessa técnica, não haveria aqui grande reclamação pois, se esta já não era fresca então, actualmente ultrapassou o ponto de saturação. Infelizmente, há mais a ligar ambos filmes: a possessão demoníaca como justificação e a nulidade que é como entretenimento.
Jaume Balagueró continua como produtor executivo, mas o guião e a realização ficaram a cargo de Paco Plaza, co- dos anteriores. No filme original, mencionava-se numa enzima, que estaria por trás da possessão da niña Medeiros, algo contagioso e que se propagava como o vírus da gripe. Já aí ficava por entender como é que o Vaticano optara por manter uma possível vítima de possessão demoníaca num velho apartamento do centro de Madrid, com análises laboratoriais a serem conduzidas com provetas sujas e relatórios de progresso registados num gravador de bobinas com quarenta anos mas, enfim, piscava o olho a Evil Dead e era graficamente adequado ao ambiente criado.
[Rec 2] (2009) reaproveitava o mesmo evento pela perspectiva de novas câmaras, mas [Rec 3] deixa completamente o molde. A acreditarmos que o tio veterinário, mordido por um paciente, será o portador do vírus, fica por explicar a presença policial antes mesmo de o contágio começar. Este filme permite apenas a conclusão de que o vídeo de uma boda é uma experiência secante, mesmo quando dá literalmente para o torto. Nem a carinha laroca de Letícia Dolera salva a honra do convento.
Rec 3 2012

Friday, August 10, 2012

ATM – Armadilha Mortal, de David Brooks


Com medo de uma silhueta volumosa que os aguarda à saída da cabina de Multibanco de um supermercado, três colegas de trabalho barricam-se no interior, à espera da polícia ou da luz da manhã. Entretanto, os ânimos exaltam-se e a violência, mas não a inteligência, escala.
O subgénero de terror dos maníacos assassinos tem-nos para todos os gostos, sendo o mais comum aquele que esconde as suas feições por trás de uma máscara ou de um gorro, ocultando as feições para assustar pela sua mera presença estática. Uns gostam de atacar em datas festivas (Halloween, Sexta Feira 13 e o Natal são as mais escolhidas), outros só se preocupam com o cenário. ATM é apenas frustrante para quem tivesse expectativas e, desde o título, o filme não as cria nem desenvolve. Um trabalho tarefeiro na escrita, realização e representação.
Antes de M. Night Shyamalan trancar gente num elevador com o Diabo a apertar a bexiga (Devil, 2010), espaços fechados em lugares desertos já eram poiso cativo para o medo. Em 1993, John Carpenter, que revolucionou o género e introduziu Michael Myers ao imaginário aterrador (1978), e Tobe Hooper (Massacre no Texas, 1974) juntaram três curtas-metragens numa cassete de vídeo, para consumo caseiro, sob o título Body Bags. O primeiro segmento passa-se numa estação de serviço perdida na América profunda, onde uma empregada nocturna tem de lidar com notícias de um assassino em série pelo rádio e um indivíduo presumivelmente mal intencionado a cirandar o estabelecimento. Recomenda-se vivamente uma consulta a este filme obscuro, mas de referência a quem quiser muito melhor do que ATM.
ATM 2012

The Tall Man, de Pascal Laugier


Depois do controverso e impressionante Martyrs (2008), Pascal Laugier anula-se completamente, com uma história desuspense de quinta categoria, passada numa terreola norte-americana perdida no pó, onde um dito Homem Alto rapta crianças às colheradas, sem que ninguém tenha pistas em relação à sua identidade ou ao paradeiro das vítimas. A finalidade do guião, também de Laugier, é simplesmente o de estabelecer um cenário e, a meio, trocar as voltas ao espectador, mudando inesperadamente de direcção, e pondo a narradora a explicar tudo no final.
Sabe a muito pouco. A reviravolta é inesperada, concede-se, mas todo o filme assenta exclusivamente nesse ponto de viragem, sem nada de interesse antes ou depois. Uma pitada de lenda urbana embrutecedora e bocejante, servida por uma apagada Jessica Biel, muito longe daquela que a Esquire elegeu como a mais bela caçadora de vampiros em 2005. E nem vale referir que a jovem saltou para o sucesso precisamente com um filme de terror, o remake deMassacre no Texas (2003), onde realmente se podia ver o filme só por ela. Se ao menos Laugier se tivesse deliciado mais com a construção narrativa, em vez de empurrá-la para o twist e daí varrê-la para baixo do tapete…
Ainda ficam por troçar os seguintes erros de palmatória: a heroína esconde-se no assento de trás do carro-patrulha do sheriff e mais tarde (ao fim de uma viagem) sai sorrateiramente… deve ser o único carro-patrulha da História com portas de trás que abrem por dentro. Muito pior do que isso, depois de a carrinha onde seguia ter embatido violentamente numa árvore e tombado, ela, que durante os últimos minutos do trajecto tivera um cão feroz a morder-lhe a canela, aventura-se no bosque sem coxear e, quando analisa o tornozelo, as marcas das dentadas são superficiais, apesar do grande volume do canídeo. Concluindo, sensações Phantasm e Jeepers Creepers são mera coincidência.
 
Tall Man 2012

Stash House, de Eduardo Rodriguez



Mistura de Sala de Pânico (2002) e Sozinho em Casa (1995), Stash House junta um has been a um never was. Dolph Lundgren dispensa apresentações, claro, o monólito russo de Rocky IV (1984) tem décadas de exposição ao celulóide e mantém a expressão cinzelada que sempre o caracterizou, mas é inegável que a idade não perdoa e que há esforço envolvido na arte de puxar ou empurrar alguém. Quanto a Sean Faris, as suas semelhanças físicas a Tom Cruise fizeram crer, a início, que estaria a tomar balanço para altos voos e Never Back Down (2008) apontava nessa direcção, mas desde aí as perspectivas, em vez de animadoras, são desoladoras, com Free Running (2011) a retirá-lo completamente de qualquer lista. Como o filme só tem quatro actores, faz-se o favor de referir os que faltam: Briana Evigan mostrava que não sabia dançar em Step Up 2 (2008) e agora fica claro que há mais coisas que não sabe fazer; Jon Huertas, simpático detective da série Castle, é um peso pluma a tentar fazer frente a Lundgren… ou um peso pesado, porque está gordo como um texugo.
 
O argumento de um estreante e a realização de um tarefeiro não ajudam. Para além de ser o típico filme onde os personagens optam sempre pela atitude imprudente em vez da cautelosa, não podem ignorar-se situações de negligência grosseira como ninguém ouvir a deflagração de uma granada na chaminé da lareira (as paredes da casa podiam ser reforçadas, mas a chaminé era uma ligação directa ao exterior) ou um explosivo de C4 que estava desarmado aparecer activo na cena seguinte (deu-se a desactivação do C4 quando a porta foi aberta à polícia, a amiga da proprietária apareceu a seguir – sem deflagração – e quando voltam a aproximar-se da porta, o C4 está inexplicavelmente armado). Já nem menciono pormenores como um vilão que cai do telhado sem se magoar ou outro que é borrifado com detergente e nem sequer esfrega os olhos. O que não pode omitir-se é alguém que entra em casa de um casal amigo, vê um cadáver no chão e um homem armado no sofá, mas a primeira atitude é tirar o telemóvel da carteira e informar que vai chamar a polícia; ou alguém que se barricara dentro de um armário à vista materializar-se, quando convém, atrás de quem abre o dito armário, de caçadeira em punho.
 
Stash House 2012

Dark Tide, de John Stockwell


John Stockwell sobreviveu a Christine, O Carro Assassino (1983), mas fugiu da Força Aérea assim que lhe propuseram ir para a Academia Top Gun (1986). Refugiou-se na praia, filmando dentro e perto de água: Crazy / Beautiful (2001), Blue Crush (2002), Into The Blue (2005) e Turistas (2006). Halle Berry queria mostrar que estava em forma, mas o papel de afro-americana de American Pie O Reencontro (2012) já estava tomado, pelo que teve de contentar-se com uma história de tubarões em tempo de piranhas.
Uma mergulhadora que gosta de fazer o que Thomas Jane já fazia em Deep Blue Sea (1999) assiste à morte por dentada de um colega de trabalho e decide mudar de ramo, mas os passeios turísticos de visita a morsas e golfinhos não pagam as contas. O antigo companheiro regressa com uma proposta irrecusável e, previsivelmente, os tubarões voltam a comer.
Dark Tide é daqueles filmes onde os personagens não agem dentro da razoabilidade (um cliente vira a dona do barco contra o imediato, quando lhe convinha estar calado, o barco precisa de séria manutenção mas avançam, irresponsavelmente), abundam as situações, tão mal montadas, que se tornam confusas, de tão súbitas (namorados discutem, barco perde a direcção, súbita tempestade, barco vira) e ainda incoerência entre elementos dentro e fora de água (sem âncora presa, o barco anda à deriva, mas a gaiola debaixo de água não sai do sítio; a tempestade é tão intensa que vira o barco, mas quando os actores vêm à superfície, percebe-se que estão a filmar numa piscina).
Dark Tide começa bem, com belas imagens de tubarões brancos verdadeiros junto de mergulhadores, mas depois do dramatismo serôdio da protagonista que não quer voltar a aproximar-se dos peixes, o realizador aliou o piloto automático ao excessivo escurecimento da película e ninguém tira partido do que não vê nem sente. E alguém devia tirar o Óscar a Halle Berry.
Dark Tide 2012

O Despertar das Trevas, de William Brent Bell


Virgem Santíssima, se Deus existisse, não iria ele velar para que houvesse melhor cinema? Terceiro filme de William Brent Bell, que em 2006 ainda conseguiu juntar umas caras conhecidas em Stay Alive, sobre um jogo de computador que matava quem o jogava. Agora, aderiu ao formato do falso documentário para investigar um exorcismo e acabou com a equipa toda possuída. Assiste-se à baratuchice do costume: luz ambiente, ausência de enquadramento, representações desniveladas, montagem cheia de cortes e solavancos para suposto realismo. Gritos e cruzes a contento, Fernanda Andrade é brasileira para quem se interrogar, Suzan Crowley podia passar Susan Sarandon perante uma plateia de cegos, há uma contorcionista que escala paredes e nem um instante de credibilidade. Ou de medo.
The Devil Inside 2012