Wednesday, November 19, 2008

Turistas, de John Stockwell


A primeira cena de Turistas, anterior ao genérico, expõe logo o contexto: o tráfico de órgãos humanos, retirados sem autorização, a dadores vivos. Espanta, por isso, que se demore mais de uma hora a regressar ao cerne da questão, com os heróis de serviço a fazerem-se, literalmente, ao bife.

Apresentando-se como um thriller, despeja um punhado de turistas atraentes (e o imprescindível fala-barato, que infelizmente é mais irritante do que cómico) num ambiente paradisíaco que rapidamente se torna hostil. Drogados e roubados, são atraídos para um matadouro no meio da selva, tendo ainda tempo para se banharem numa cascata e visitarem grutas submersas, que previsivelmente virão a ser muito úteis na sua eventual fuga.

Infelizmente, as premissas que apregoa são apenas tocadas de tangente. Demasiado parco em imagens chocantes (a única cena de remoção de órgãos assusta menos que a célebre autópsia ao extraterrestre de Roswell; e há sempre, no enquadramento, um peito feminino desnudo para onde desviarmos a vista), é discreto a mostrar banhistas (o topless do início não é para aquecer a imaginação, porque não há mais) e nem sequer funciona como cartão de visita do Brasil, visto que as filmagens se resumem a uma área pobre do interior de Ubatuba (nunca se vê uma cidade, como se o país fosse apenas praias, vegetação e povoações com ar de favela).

O pior de tudo é a vacuidade reinante. O filme avança numa lentidão confrangedora, e quando finalmente submergimos no perigo, o director de fotografia Enrique Chediak poupa demasiado na iluminação. Há vultos a correr na floresta ou debaixo de água, mas não se percebe quem persegue ou é perseguido, apenas folhagem a abanar. Tanto mais que, quando um dos vilões é morto debaixo de água, nos perguntamos se será o protagonista, porque dois morenos de barba por fazer e cabelo curto, à noite, são ambos pardos...

Dizer que os erros se ficam por aqui é um eufemismo. O vilão de serviço, cheio de esgares de mau só porque fica bem, explica que os órgãos que arranca das suas vítimas são para oferecer aos hospitais da região, que está a prestar um serviço público, porque os estrangeiros já roubam quanto baste o pobre povo brasileiro. E o que dizer do golpe de psicologia barata que uma das heroínas usa para virar dois vilões um contra o outro, sem os conhecer de lado nenhum – a isto é que se chama intuição. A banda sonora fm é tão barulhenta que fere os ouvidos, tão desajustada que distrai e faz procurar constantemente por um rádio para desligá-lo. A banda sonora instrumental, de Paul Haslinger, pelo contrário, é demasiado elementar.

Existem duas versões para o filme, sendo que a versão Unrated tem mais três minutos de duração, tempo para o vilão-mor enfiar um lápis no olho de um subalterno, por não ter um afiador à mão; a cena não tem interesse para a história nem é uma revelação no campo dos efeitos especiais.

John Stockwell é um rosto associado aos anos 80, tendo entrado como actor nos filmes Christine e Dangerously CloseTop Gun e na série televisiva Norte e Sul. Mudou-se para o Havai como argumentista e desde 2000 tem sido produtivo como realizador, sempre perto ou dentro da água, dos filmes Bela Loucura, A Onda dos Sonhos, Profundo Azul e Turistas. Foi responsável por três episódios da série A Letra L gravados em 2007. A ideia para Turistassurgiu-lhe após ter sido roubado sob a mira de uma arma e agredido por uma gang no Peru, quando se encontrava de férias. As filmagens deviam ter-se registado na Guatemala, mas as escassas infra-estruturas desse país obrigaram-no a mudar-se para o Brasil. Stockwell pode ser visto num cameo, na última cena do filme, a discutir com a namorada à entrada do avião.

Apesar do corpo de Melissa George ser o mais atleticamente esguio de entre as belezas destacadas, é de todo imprescindível uma referência à actriz que representa a finlandesa Annika, representada pela portuguesa Olga Diegues, que até tem direito a uma frase completa.

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