Friday, December 19, 2008

Eden Lake, de James Watkins

O argumentista de O Olho Que Tudo Vê (2002), Gone (2007) e A Descida 2 (2009), em 2008 sentiu-se com coragem de realizar e o resultado foi Eden Lake. Cabe esclarecer que O Olho Que Tudo Vê era um thriller pindérico que ia a reboque dos concursos em formato reality show e Gone um inane road movie com um psicopata de cartilha. A Descida 2 terá a tarefa ingrata de suceder a uma pequena obra-prima de terror (A Descida, de Neil Marshall, 2005) e irá com certeza desiludir.

Eden Lake é, como as restantes obras mencionadas, uma desilusão. Impressionado com o facto de as criaturas malignas do filme francês Eles (2006) serem adolescentes, decidiu atirar um casal londrino para um fim de semana de campismo selvagem, desconhecedor do quão selvagem este iria ser. O casal monta tenda numa praia situada algures por trás de um imenso pinhal e é incomodado por um grupo de jovens barulhentos, mas não satisfeito com uma primeira noite cheia de apreensões, decide ficar e repetir a proeza. Primeiro erro? Infelizmente, não. Antes desse, já outros se tinham verificado e qualquer pessoa com o mínimo de juízo teria feito as malas e ido procurar outro poiso. Talvez por isso, é tão difícil simpatizar com o casal protagonista, mesmo depois de os problemas começarem. Há algum suspense e emoções tépidas, mas a intenção de manter um tom realista na perseguição montada faz com que não se assista a nada de novo. Na recta final, a protagonista acaba por dar muito pouca luta e o desfecho, em vez de ser chocante, é patético. Além disso, custa a acreditar que seis adolescentes de famílias diferentes estejam fora de casa mais de 24 horas sem que nenhum dos pais queira saber deles, nem sequer da rapariga do grupo.

A actriz Kelly Reilly está muito querida em As Bonecas Russas (2005), mas em regra é embirrante e antipática, como em A Residência Espanhola (2002) e Ms Henderson Presents (2005). Em Eden Lake, faz de parvinha, o que não é um passo na direcção certa. Michael Fassbender, de 300 (2006) e Fome (2008) também não é empático. E isto é o pior que podem ser as vítimas de um filme de perseguição por quem devemos torcer.

Eden Lake 2008

Saturday, December 6, 2008

Rovdyr, de Patrik Syversen

Com apenas 73 minutos de duração, Rovdyr é a versão norueguesa do survival horror, sub-género de terror em que um pequeno grupo de jovens é perseguido numa floresta por caçadores furtivos e tem de lutar pela sobrevivência. Infelizmente, ao cabo de mil variações do tema, Rovdyr não apresenta uma única novidade, ficando-se inclusivamente entre os menos inspirados. Tecnicamente competente ao início, acaba por revelar-se como um projecto sem ambições, cuja construção do suspense é desbaratada por um desenvolvimento vulgar. Os maus não abrem a boca e os bons fartam-se de berrar. Absurdo é o facto de os maus serem apresentados como super-homens na sua primeira aparição, mas rapidamente se tornarem idiotas sem uma estratégia de caça e passíveis de serem facilmente caçados, inclusivamente abandonando armas em locais acessíveis.

Fica a curiosidade de este ser o segundo slasher produzido na Noruega (O primeiro foi Fritt Vilt, 2006) e o segundo a ter classificação de Interdito a Menores de 18 Anos (o primeiro foi Naboer, 2005). A banda sonora está a cargo do inglês Simon Boswell, que já compôs para Danny Boyle (Pequenos Crimes Entre Amigos) e Clive Barker (O Senhor das Ilusões), mas aqui o seu segredo é não se ouvir.

Rovdyr 2008

Quarentena, de John Erick Dowdle

É muita lata o realizador John Erick Dowdle atribuir-se créditos de argumentista (e à sua mulher Drew) quando Quarentena segue, sem desvios, o original [Rec], de que é o remake directo. Ainda mais incompreensível é a sua existência, sendo [Rec] um filme espanhol do ano passado, com distribuição internacional, nomeadamente nos EUA (por muito que custe aos americanos ler legendas).

A premissa de [Rec] era simples. Uma jovem repórter de TV iria acompanhar dois bombeiros numa missão de rotina e dar por si fechada num prédio com uma população crescente de zombies. Tratava-se então de gerir o suspense durante sensivelmente uma hora, com a totalidade da filmagem a fazer-se pela objectiva do cameraman.

Quarentena decide fazer o mesmo, mas à americana. O que nunca é bom sinal. Em vez da querida e amorosa Manuela Velasco no papel da repórter, temos uma embirrante e histérica Jennifer Carpenter (Dexter e O Exorcismo de Emily Rose), que em vez de dizer «Hola, soy Angela Vidal» pronuncia o apelido como Vaidél. Os bombeiros, pelo aspecto dos seus bíceps, passam mais tempo no ginásio do que a apagarem fogos. Os moradores do prédio, em vez de serem pessoas anónimas, são quase todos actores reconhecíveis por um ou outro papel. Assim, perde-se de imediato a ideia de estarmos a assistir a algo real. Os bombeiros são Jay Hernandez (Hostel) e Jonhathon Schaech (Road House 2, 8MM 2, duas sequelas apenas no título), o cameraman é Steve Harris (The Practice e O Rochedo) e os moradores incluem Rade Serbedzija (O Santo e Missão Impossível 2), Greg Germann (Ally McBeal) e Marin Hinkle (Começar de novo). Em vez de concentrar a atenção na história, é um erro permitir que tantos rostos distraiam a atenção.

É impossível não tecer comparações face a um remake tão apressado. Sem a frescura snuff de [Rec] nem o companheirismo entre a repórter e o cameraman, o espectador sente-se menos inclinado a ter empatia por ela. Enquanto que no original os inquilinos se reúnem voluntariamente no átrio do prédio, aqui são obrigados a sair dos seus apartamentos sem justificação lógica. Em vez de tentaram organizar-se, os sobrevivente parecem baratas tontas. No final, o antigo gravador de bobinas que facilitava alguns esclarecimentos confusos, limita-se a dar estática.

Para quem viu [Rec], Quarentena é como assistir ao Psicho de Gus Van Sant. Uma repetição cena-a-cena, sem a menor centelha ou emoção. E havia lugar a melhoramentos, porque [Rec] não é uma obra-prima, mas um vulgar filme de zombies num cenário diferente. Por exemplo, não faz sentido reproduzir a cena imbecil em que, depois de uma menina se ter transformado e mordido a mãe, o polícia se aproxima dela cheio de paninhos quentes e tenta dar-lhe a mão para levá-la para junto dos outros. Que polícia se ofereceria ao contágio com tamanha ingenuidade?

É legítimo perguntar se a versão de Hollywood tem melhores efeitos visuais, mas infelizmente o orçamento deve ter sido esgotado nos cachets. A solução foi a de abanar violentamente a câmara, técnica ancestral de realizadores de série Z para evitar a identificação de efeitos especiais demasiado económicos, aqui levada ao extremo, e poupar na electricidade, optando por lanternas. [Rec] manteve as luzes do prédio acesas, permitindo assim ver melhor o que se passava. Isso em nada prejudicou o suspense e evitou que tivesse de franzir-se tanto a vista à procura de pormenores.

Em [Rec], a criatura do clímax, iluminada por uma distorcida nightvision verde, era desproporcional, contribuindo isso para uma dose de inquietação, mas em Quarentine é apenas uma pessoa magra em cuecas. Com tudo isto, quando a repórter, histérica, grita que vão morrer, porque «eles não se ralam connosco», só me apeteceu dizer, com sotaque brasileiro, No, Michael, they don’t care about us.

Quarantine 2008

Fronteira(s), de Xavier Gens

Após um assalto, um grupo de skinheads em fuga pára num motel da França profunda e é perseguido, torturado e morto pela família de canibais que gere o espaço hoteleiro. Será um caso de maus que enfrentam piores, mas sinceramente não é o suficiente para criarmos qualquer empatia com as supostas vítimas. É mais uma versão de Massacre no Texas, ao ponto de incluir uma cena em que a única sobrevivente em fuga apanha boleia de um canibal que a traz de volta e ainda uma refeição em família com a nova aquisição feminina à mesa.

Uma vez desencantados com a pobreza do guião e com a montagem acelerada e cheia de efeitos e filtros de vídeo, não há gore que nos traga de volta a boa vontade. Película de sadismo engarrafado e histerismo em piloto automático, Fronteira(s) não respira o suficiente para haver lugar à criação de suspense. É tão grande a sua intenção de impressionar graficamente que o desequilíbrio é notório.

Próximo de Alta Tensão (Alexandre Aja, 2003) e Mártires (Pascal Laugier, 2008), Fronteira(s) também aposta em mulheres fortes, mas até isso já não é novidade desde os anos 70. Bem regado de sangue e desmembramentos, com resultados desiguais conforme os casos, é curioso reparar na aceitação cultural da violência mas que a pudicícia se mantém na nudez, ao ponto de se dar banho a uma mulher que mergulhou numa pocilga sem lhe tirarem a cueca e o soutien e a seguir deitarem-na já sem roupa numa cama lavada (mas cobrindo-lhe o corpo); não seria mais higiénico lavarem-na já nua?

Frontiere(s) 2007

Patologia, de Marc Schoeleman

Escrito e produzido por Mark Neverdine e Brian Taylor, as cabeças por trás de Crank, Patologia é um thriller passado na morgue. Um grupo elitista de estudantes de medicina, exibicionista e com evidente carga bad boy, decide adoptar o novo e ambicioso aluno da turma. O desafio é que, para além de esquartejarem cadáveres durante o dia, à noite cada um tem, rotativamente, de trazer um novo espécime para a mesa, ganhando pontos por originalidade homicida e dificuldade na determinação da causa de morte.

Mais post mortem do que torture porn, Patologia aproxima-se de um CSI em que os patologistas, com demasiado gosto pelo bisturi, antes de estudarem o morto, tiraram-lhe a vida. O argumento apresenta algumas surpresas inesperadas e bem vindas, como a dúbia moralidade do protagonista, que participa voluntariamente na onda de crime e sente falta da intensidade viciante da adrenalina e descarga sexual quando está com a namorada, uma mosquinha morta em comparação com a depravação a que se habituou. Infelizmente, são desperdiçadas as oportunidades de mergulhar nesse mundo que lembra as matilhas de vampiros de Near Dark, Os Rapazes da Noite e O Pacto, e ficamos com um projecto que tem medo de arriscar, não compõe minimamente um único personagem e desperdiça demasiado cedo o material, como o facto do chefe da matilha, frio e controlado, se tornar subitamente num desequilibrado histérico. Relativamente a este, é de notar a composição de Michael Weston, actor que ingressou na equipa do Dr. Gregory House para a quinta temporada da série, mas tem aqui um papel bem parecido com o do próprio House no que toca a ego e fanfarronice.

Marc Schoeleman não soube o que fazer com o material disponível e, qual projecto da geração pós-MTV, banqueteia-se no óbvio da camada rasa e, para mal dos seus pecados, confunde melancolia com tensão. Enquanto thriller, dispersa-se no grafismo de algumas autópsias e em meia dúzia de esgares, o erotismo assenta fugazmente na latente sensualidade de Lauren Lee Smith que não perdeu o hábito (a chef de A Letra L e ninfomaníaca de Vem Comigo) esquecido por Alyssa Milano (Poison Ivy 2, Embrace of the Vampire, belos tempos), aqui tão baça que mete dó. Milo Ventimiglia, o protagonista, já foi contratado para os próximos dois filmes da dupla Mark Neverdine e Brian Taylor, e filmou Patologia entre as duas primeiras temporadas de Heroes.

Pathology 2008

Saw V, de David Hackl

Já sem Darren Lynn Bousman ao leme (mas dirigiu a cena de abertura), a saga de Saw não dá mostras de abrandamento, tanto mais que conserva um personagem, no final, em posição para novo jogo. A realizar está o estreante David Hackl, que já era production designer da franchise desde Saw II e director da unidade de apoio desde o III.

Ao cabo de cinco películas, o conceito por trás de Saw continua a ser abraçado, desdobrado-se em esquemas de perpetuação da imagem de marca, chegando ao cúmulo de matar o cérebro das operações (Jigsaw) em Saw III, mas mantendo-o omnipresente até à data, através do rosto do fantasmagórico Tobin Bell. Os flashbacks permitem dar corpo a uma história inicialmente envolta em mistério e as revelações provam-se labirínticas o suficiente para que a lógica não se perca, oferecendo-nos um percurso iniciático cheio de nuances daquele que antes não passava de uma voz cavernosa em meia dúzia de cassetes áudio.

Desde Saw IV que a fórmula se articula em duas partes distintas, factor ignorado nos três primeiros tomos mas agora recorrente. Numa delas, tentam ligar-se os pontos soltos, descobrindo como os novos personagens não aparecem por acaso, já andando na sombra há muito tempo, e que os factos de Saw IV ocorreram paralela e simultaneamente aos de Saw III e os de Saw V imediatamente a seguir. É algo que pode ser encarado mais como um extra do que como um motor da acção, mas a curiosidade mórbida por árvores genealógicas encontra aqui satisfação. A segunda parte são os jogos de vida ou morte, que representam a raiz do título, sendo que Saw é um trocadilho entre puzzle (Jigsaw) e serra (saw). Desta vez, porém, o jogo não tem tempo para respirar. As etapas são apressadas e os jogadores demasiado automáticos nas suas reacções. Não perde a coerência, mas não tem a menor espontaneidade.

Em suma, Saw V não investe em nada de novo, apenas se limitando a agir em conformidade com aquilo a que os fãs se habituaram. Entre o comodismo e a inventividade, podia ser pior. Contudo, a produção em série extinguiu o factor surpresa. Até Charlie Clouser, antigo membro dos NIN e encarregue da banda sonora desde o início, limita-se a reciclar o tema original e a compor algumas variações mundanas.

Saw V 2008

Nas Costas do Diabo, de Guillermo del Toro

Blade 2 (2002) e Hellboy (2004) estabeleceram em Hollywood o realizador mexicano Guillermo del Toro, e não há dúvida de que ambos trabalhos apresentam uma solidez a toda a prova. Após ter visto Cronos (1993), o aclamado Pedro Almodóvar indicou a del Toro que pretendia produzir o seu filme seguinte. Em 1997, houve ainda tempo para Mimic, uma experiência irrepetível para o realizador, por causa das constantes discussões com o produtor Bob Weinstein (produtor do filme e dono da Miramax), num projecto que era para ter sido apenas uma curta metragem de 30 minutos.

Com produção El Deseo S.A., Nas Costas do Diabo é o filme que Guillermo del Toro apresenta como o irmão de O Labirinto do Fauno, uma história de fantasmas de uma pobreza estarrecedora, tão penoso de assistir como vácuo é de ideias.

Passado num infantário, durante a guerra civil espanhola, por onde vagueia um menino falecido desde a noite em que uma pesada bomba caiu de um avião mas não deflagrou, pairando esta ainda no pátio, como uma sentença de morte à espera de ser escrita. Ao lar doce lar dos meninos abandonados chega um novo órfão, daqueles decididos a solucionar mistérios, e entre essa pessegada e um empregado que divide o seu tempo como amante da directora do orfanato e a sonhar com o ouro que esta guarda no cofre, arrasta-se uma película sem a menor chama.

Optando por uma abordagem clássica e académica, o filme tropeça em todos os clichés do género, incluindo o do menino que se esconde no armário para não ser apanhado pela alma penada, que roda a maçaneta do lado de fora e se esquece que as almas penadas atravessam paredes. Se Marisa Paredes (musa de Almodóvar) e Frederico Luppi (que pudemos ver este ano em O Enigma de Fermat e já representara para del Toro em Cronos e em O Labirinto do Fauno), estão irrepreensíveis, infelizmente pouco contribuem para a história. É Eduardo Noriega (que Alejandro Aménabar dirigiu em Tesis e Abre Los Ojos) quem tem uma prestação sem a menor credibilidade, que recai unicamente em esgares e frases cuspidas sem determinação. Para piorar as coisas, é o seu personagem que faz despoletar todos os acontecimentos.

Para além dos pindéricos efeitos especiais em photoshop trial version, fica a questão: se o que a alma penada queria era vingar-se de um personagem específico e podia vaguear por todo o orfanato, porque desperdiçou inúmeras oportunidades de atacar alguém que nunca se escondeu?

El espinazo del diablo 2001

Sunday, November 23, 2008

A L'Interieur, de Alexandre Bustillo e Julien Maury


O renascimento do cinema francês de terror tem acelerado nos últimos anos, com títulos como Baise-Moi (2000), Dans Ma Peau (2002), Irreversível (2002), Alta Tensão (2003), Eles (2006) eFronteira(s) (2007), mas nenhum é tão impressionante e inesperado como A L'Interieur. Qual descontrolada montanha russa macabra, este filme não recua perante nada, sugando-nos através de um vórtice de demência com uma frieza implacável. Muito para além de qualquer torture porn americano, este trabalho de laivos góticos é inigualável no seu banho de sangue, de uma audácia e ousadia que não conhecem limites. É a prova de que gore excessivo não é necessariamente um defeito, se for adequadamente explorado.

A história é simples. Na véspera de dar à luz, uma mãe solteira é incomodada por uma mulher que lhe toca à campainha a altas horas da noite a pedir para entrar. A recusa não vai ser tão simples. É um mero pormenor, mas sublime quando nos detemos nele, que a princípio não simpatizemos com Alysson Paradis (irmã de Vanessa Paradis), mas a impenetrável e perturbadora figura de Beatrice Dalle como anjo vingador vai abalar todas as nossas barreiras e fazer-nos torcer por ela até à exaustão.

Primeira obra de Alexandre Bustillo e Julien Maury, com distribuição da Dimension Extreme (uma etiqueta dos irmãos Weinstein da Miramax para albergar títulos bizarros), A L'Interieur é um filme surreal e grotesco, cujo maior feito é manter um pé na autenticidade e o outro enfiado na trituradora. A abertura é imediatamente promissora, quando assistimos a um feto lactante dentro da barriga da mãe e o rosto deste choca subitamente contra a câmara, em resultado de uma paragem brusca. É pena o feto em CGI ser pouco realista (e descabidamente cómico) e a maquilhagem do rasgão no rosto da protagonista não sobreviver aos close-ups, mas esses apontamentos não fazem a menor mossa naquele que é um dos exercícios mais marcantes e estranhamente apelativos do cinema de terror actual.

Jaume Balagueró, realizador de [Rec] (2007), revelou à mítica revista Fangoria o seu interesse em dirigir um remake de A L'Interieur.

A L'Interieur 2007

Escuridão, de Jaume Balagueró


Enésima história de casa assombrada, Escuridão falha pela banalidade do argumento, das prestações e dos sustos. A direcção de fotografia cria algumas imagens interessantes na primeira parte mas, na ausência de uma história que as suporte, estas perdem-se no vazio de uma segunda parte simples e funcional.

Para não falar da aberração que é o clímax (Iain Glen no círculo é demasiado à pressão), como é possível que ninguém naquela casa ache que as senhoras vitorianas da foto encontrada no armário são demasiado bizarras (têm os olhos tão encovados que parecem usar óculos escuros), nem mesmo depois de a emoldurarem na parede ?

Em 1999, Jaume Balagueró apresentou um intenso Os Sem Nome(baseado no livro de Ramsey Campbell), mas desde aí tem escrito os argumentos e a qualidade narrativa decaiu sobremaneira (Escuridãoe Frágeis). Em 2007 teve sorte de o seu filme de zombies de câmara ao ombro ter caído no goto (Quarentena é o seu remake americano de 2008) e prepara já uma sequela, [Rec]2.

O elenco parece ter vindo de todo o lado. Anna Paquin é uma canadiana que cresceu na Nova Zelândia, Lena Olin é sueca, Iain Glen é escocês, Giancarlo Gianini italiano, Fele Martinez espanhol e o pequeno Stephan Enquist de Singapura (pai sueco e mãe espanhola). Não havia necessidade de tantos sotaques, quando nenhum é assustador.

Darkness 2002

Thursday, November 20, 2008

The strangers, de Bryan Bertino

Em 2006, dois franceses alcançaram o inesperado. Sem banda sonora e apenas dois actores, David Moreau e Xavier Palud conseguiram manter um suspense irrespirável durante 70 minutos. Eles usava magistralmente pequenos artifícios como pedras lançadas contra vidros, batidas na porta e sombras fugidias, criando uma atmosfera de intimidação inacreditável.

The Strangers é um descarado remake americano de Eles, por um realizador-argumentista aldrabão, que abusivamente atribui a inspiração a eventos reais (sim, os irmãos Cohen disseram o mesmo sobre Fargo) e em entrevista sublinhou os homicídios de Charles Manson e o facto de uma vez em criança ter aberto a porta a um estranho que lhe perguntou por alguém que não morava ali e nessa noite casas das redondezas terem sido assaltadas. Sobre Eles, nem uma palavra.

Na esperança de que poucos americanos tivessem visto o filme francês, Bryan Bertino utilizou exactamente o mesmo estratagema. Uma casa próxima de um pinhal, um casal sozinho e três figuras com os rostos cobertos (gorros no original, máscaras na versão americana) a tentarem amedrontá-los. Pedras contra os vidros, pancadas na porta e sombras fugidias. Até a justificação dos maus para os seus actos, que pode ler-se no próprio cartaz (Porque estavam em casa), é muito próxima da de Eles (Só queríamos brincar). Mas em vez de uma atmosfera de intimidação, lê-se apenas o seguimento de uma fórmula e muito aborrecimento.

Não há desenvolvimento dos personagens. Os protagonistas são tão anónimos como os psicopatas, com a mera diferença de que não usam máscaras e sabemos onde moram. Através de um flashback, é-nos relatado que ele a pediu em casamento nessa noite e ela recusou, mas não sabemos porquê. Quando os sustos começam, agem de modo assustado. Os psicopatas não têm expressão, não só por cobrirem o rosto, como pelo facto de não falarem. Como o filme é americano, eventualmente acabam-se as pedras para atirar às janelas e o armário dos clichés é escancarado à nossa frente (e faz perguntar como é que num filme que se quer baseado em factos reais o psicopata pode estar mesmo atrás da vítima, mas quando esta se vira não está lá ninguém). No final, assiste-se a um curto torture porn, tão introvertido que mete dó.

O filme abre com uma narração que pretende lembrar a da saga Massacre no Texas (1974), mas tão artificial e a querer colar-se ao figurino que se confunde mais com a de Cobra (1986). Liv Tyler foi uma péssima escolha (ela e Scott Speedman formam o casal vítima), não porque não saiba gritar a contento, mas porque se perde demasiado tempo a pensar em como está gorda.

Noutra produção de 2007, também Kate Beckinsale (que faz dupla com Scott Speedman na trilogia Underworld) entrou num filme com contornos semelhantes, O Motel. Brincadeiras Perigosas, de Michael Haneke, um original de 1997 e com remake de 2007, pode considerar-se percursor deste tipo de thriller. Mas, nunca será demais repetir, The Strangers é demasiado baço, especialmente por apenas repetir uma fórmula e respectivos clichés.

Fica a curiosidade de que David Moreau e Xavier Palud, os responsáveis por Eles, rumaram para Hollywood com um convite para realizarem o remake de O Olho (2008) dos irmãos Pang (2002) e não poderiam ter feito pior trabalho.

The Strangers 2008

Wednesday, November 19, 2008

Exte: Hair Extensions, de Sion Sono


Um elemento indissociável dos filmes de terror asiáticos prende-se com longas cabeleiras negras, que ora cobrem misteriosamente rostos maléficos, ora se espalham como ondas pelo tecto de armários com cheiro a alma penada. Mais do que um anúncio Vidal Sassoon, esta é uma imagem de marca da beleza oriental, onde os cabelos nunca encaracolam naturalmente.

Sion Sono (Clube Suicida, 2002) partiu desta ideia e eliminou o intermediário humano, que seria apenas um saco para o cabelo se desenvolver e fazer maldades. Infelizmente, optando por desenvolver o conceito sozinho, Sion Sono tornou evidente a falta que um cérebro faz por baixo do couro cabeludo. Exte: Hair Extensions revela-se como um único gag que, uma vez esgotado, denuncia todas as falhas de um argumento feito em cima do joelho.

Uma montagem mais rápida, que encurtasse diálogos inúteis e reduzisse os momentos mortos ou irritantes (todo o subplot sobre a irmã prostituta que agride a filha e rouba a irmã), permitiria uma experiência mais satisfatória, ainda que o material em si nunca chegue a ter peso. Os flashbacks introduzem o tema do tráfico de órgãos, sem nada explicarem sobre a origem do cabelo assassino. Mas, enfim, quando o cabelo chega através de fax à casa da vítima, torna-se claro que a história nunca teve o rumo pensado e disparou em todos os sentidos, da comédia ao surrealismo, com meras pitadas de terror e muita obsessão. Convém dizer que a maioria dos efeitos pilosos se obtiveram através de animação fotoestática (stop motion) e não por computador, apesar dos bons resultados. E trabalhar com cabelo deve ser tão difícil como com animais.

Com Chiaki Kuryama, a actriz japonesa que em Kill Bill Vol. I vestia uniforme escolar e tinha por arma uma go go ball.

Ekusute 2007

Uma Chamada Perdida, de Eric Valette


Para quem ainda não percebeu que a imaginação desapareceu de Hollywood, chega mais um remake do horror asiático. O original de Takashi Miike (2003) já chegava depois de RinguJu-On e O Olhoterem dispersado sequelas a eito, mas o cineasta de Anjo ou Demónio (1999) e Ichi –O Assassino (2001) sempre foi demasiado persistente para não se lançar ao barco já depois de este ter largado o ancoradouro.

As cassetes de vídeo assassinas já tinham perdido a frescura com o advento do DVD e a internet também já tinha sido açambarcada porKairo (2003), mas os telemóveis ainda não tinham dono. A história de Chakushin Ari era estúpida e cheia de buracos, mas nada travaria Takashi Miike, disposto a assustar com qualquer barro que lhe pusessem à frente. E é por isso que o filme, de certa forma, escapa da total abnegação: Miike tem um controlo total sobre a mise-en-scène que mantém o cinéfilo na ponta do assento, atento e interessado, mesmo quando se torce o nariz à falta de lógica. Em 2005, o Japão produziria uma sequela de Chakushin Ari, mas realizada por um tarefeiro e directamente para o mercado de vídeo.

remake de Uma Chamada Perdida surge após os de Ring, Dark Water (ambos de Hideo Nakata), Kairo (Pulse em inglês), Ju-on – A Maldição e O Olho, tendo Ring, Ju-on e O Olho sequelas (e Ringu até tem uma prequela) asiáticas. Excluindo a versão de Gore Verbinski de Ring, que é melhor do que o original por uma gestão gráfica eficiente e por o amante da protagonista ser um homem normal, ao contrário de um médium como no original (o que provocou alguns facilitismos no descortinar do mistério em Ringu). Dito isto, fica claro que remake de Uma Chamada Perdida não merece grandes elogios. E não os merece porque Eric Valette não é Takashi Miike, e na verdade não é ninguém. Importado de França com um curioso filme sobrenatural passado quase integralmente dentro de uma cela prisional (Maléfique, 2002) e algum trabalho televisivo na valise, era duvidoso que a falta de ideias de Uma Chamada Perdida fosse compensada por um contraponto visualmente claustrofóbico e aterrorizador. Não foi.

Basicamente, o enredo de Uma Chamada Perdida segue um conjunto de vítimas que são avisadas da sua própria morte iminente através de uma mensagem de voz no seu telemóvel, em que ficam a saber o momento exacto em que vão morrer. A heroína tem de descobrir como livrar-se da maldição antes chegue a sua vez, auxiliada por um polícia cuja irmã foi vítima da mesma entidade. No final, muita coisa fica por explicar. Se (spoiler alert – salte para o parágrafo de baixo) a assassina era a filha fantasma e não a mãe como inicialmente pensado, quem contactava por voicemail era a mãe, a avisar as vítimas seguintes, e não a assassina. O que não se percebe é a razão do modus operandi da filha – se escolhesse vítimas sem telemóvel, a mãe não poderia avisá-las. E se a filha morreu em casa, com asma, qual a relação com o incêndio no hospital onde a mãe faleceu?

Uma Chamada Perdida não tem um único momento arrepiante. Atira imagens soltas de pessoas distorcidas por CGI de baixa qualidade contra a tela e apresenta um elenco desadequadíssimo. Shannyn Sossamon passava por estudante universitária em As Regras da Atracção e em 40 Dias e 40 Noites, ambos de 2002, mas seis anos mais tarde já estava a tempo de ter-se licenciado, tanto mais que tem trinta anos. Edward Burns tem precisamente quarenta anos, o que torna descabida a sugestão no final do filme de que ele e a estudante universitária (personagem por regra à volta dos dezoito/vinte anos) poderão vir a namorar.

Eric Valette afirmou não ter visto Chakushin Ari e ter pedido aos actores para o imitarem – mas, quando se faz um remake, este deve ser o passo mais estúpido que um realizador pode dar. Para não repetir possíveis erros do original e poder melhorar as cenas que vai recriar. Enfim, Eric Valette encontrou inúmeros erros novos para cometer. E cometeu-os todos.

One Missed Call 2008

Rogue, de Greg Mclean


Depois de entediar com um serial killer a motor, perdido algures nas estepes australianas, Greg Mclean submergiu o assassino e encheu-o de escamas. Para alimentá-lo, atirou um barco cheio de turistas para o seu território. É óbvio que o crocodilo ficará em jejum durante a maior parte da película, como mandam as leis da gestão do suspense, mas a verdade é que também o cinéfilo é deixado à fome, com um grupo de presas sem empatia, que pedimos que sejam comidas mais depressa, o que, infelizmente, não acontece.

Rogue não investe no enriquecimento dos personagens. Temos os refilões, os choramingas e os empenhados, mas nem os primeiros se queixam muito, nem os últimos fazem grande coisa. O crocodilo de CGI aparece fugazmente aos 50 minutos e a contento na cena final, mas se os tubarões de Perigo no Oceano (1999) provocavam bocejos, este crocodilo podia ser metido na mesma jaula.

Espanta ver Radha Mitchell (que já representou para Woody Allen emMelinda e Melinda, 2004) neste enguiço sem emoção, mas o mesmo não se pode dizer de Michael Vartan, que não se destacou desde a série Alias – A Vingadora (Câmara Indiscreta, de 2002, e Uma Sogra de Fugir, de 2005). Quanto a Sam Worthington, que está prestes a deixar de ser um desconhecido (Terminator 4 e Avatar, ambos para 2009), é impressão minha ou é muito parecido com Chris O’Donnell quando este estava em forma?

Afficcionados de Wolf Creek (2005), o filme de estreia de Greg Mclean, gostarão de ver John Jarratt, o vilão desse filme, regressar como secundário inútil. De resto, salvam-se as abundantes paisagens paradisíacas que dão vontade de visitar, mesmo correndo-se o risco de ser-se devorado por um crocodilo feito em computador (e até esse risco é diminuto, tão breve é o tempo de antena do predador de serviço).

Rogue 2007

O Olho 2, de Danny & Oxide Pang


Num concurso para manchar o seu maior feito, os irmãos Pang certamente ficariam entre os finalistas. O Olho 2 tem a qualidade amadorística de um telefilme, tanto ao nível gráfico como narrativo, a história parece uma colagem de cenas sem sentido, a cena da tentativa de suicídio não se articula com o resto e o próprio título parece deslocado. Nada acontece à vista da protagonista para que esta comece a ver fantasmas e a explicação final é tão simplória que não podia deixar de ser a maior desilusão de um filme sem uma única cena de valor. Aliás, como filme de terror, é incapaz de uma imagem perturbadora ou de um único susto.

Os irmãos Pang assinaram um terceiro filme da série O Olho, humoristicamente intitulado O Olho 10. em 2007, voaram até aos EUA para assinarem o pindérico Os Mensageiros e fizeram Nicolas Cage voar até à Tailândia em 2008 para filmar Bangkok Dangerous. Shu Qi, que o público ocidental recordará de Correio de Risco (2002), é a protagonista que vê fantasmas, mas enquanto que em O Olho a protagonista via fantasmas porque a sua operação à córnea lhe dava essa faculdade, em O Olho 2 a situação é tratada com banalidade, sendo que os fantasmas ora surgem nos espelhos e não na realidade, ora um mero piscar de olhos faz com que a personagem deixe de os ver.

Gin Gwai 2 2004

Despertar da Morte, de Peter e Michael Spierig


Comédia de zombies australiana com alegria no gatilho. O lema é disparar sobre tudo o que se mexe e quanto mais vezes melhor. Aparte isso, não há muito a acrescentar, para além de alguns momentos de estética à John Woo, uma história que se torna algo confusa na recta final (os extraterrestres afinal são bons, maus ou não importa?) e a cena pós-climática é um mero pró-forma.

Os irmãos Spierig desdobraram-se nos sete instrumentos para pagarem o filme do seu próprio bolso, filmarem todas as cenas em praticamente um ou dois takes e montarem nos seus computadores pessoais, onde criaram também os efeitos especiais, numa pós-produção que demorou nove meses. O duo tem previsto para 2008 o filme Daybreakers, desta vez sobre vampiros. Nota para a caracterização de Dirk Hunter, o polícia, bastante próxima dos tempos de ouro de Eric Idle, dos Monty Python Flying Circus.

Fritt Vilt, de Roar Uthaug


Slasher norueguês passado num hotel abandonado no meio da montanha nevada de Jotunheimen, onde um grupo de cincosnowboarders descobre não estar tão sozinho como julgava. O sangue começa a correr apenas aos 40 minutos e até então o filme não aproveitou o seu tempo nem para nos dar a conhecer os protagonistas, que permanecem finos como papel, nem para instilar medo para além da ocasional sombra fugidia. Por essa altura, já temos uma ideia de quem será o responsável pelo que ainda nem aconteceu e, voilá, estamos correctos.

Sem uma nesga de originalidade, este herdeiro do velhinho Sexta Feira 13 avança como um elefante por uma loja de porcelanas. Nunca se viu ninguém fazer tanto barulho quando a intenção era não fazer nenhum; mas como o que conta é a intenção, o assassino, apesar de familiarizado com o espaço, não ouve nada. Quando a logística mete água, está o caldo entornado. A primeira vítima corre por um corredor com um ombro cheio de sangue, tropeça, cai, arrasta-se e até se apoia contra uma porta; pouco tempo mais tarde, outro personagem percorre o referido corredor e o mesmo está imaculado. Como é que nunca ninguém apanha o assassino de esfregona na mão?

Fritt Vilt é um slasher medíocre que nem sequer capitaliza no cenário. Filmado no topo do Jotunheimen (o equipamento teve de ser levado de helicóptero), a uma temperatura de 25ºC negativos, pouco mais é do que branco e uma cabana. O mini-twist final é irrisório e responde a uma questão que só se ponderou muito levemente no início, mas sempre mostra a natureza da besta. Explicações, não há, apesar de ser mais um daqueles filmes em que o assassino tem no seu quarto, à mão de semear, providenciais recortes de jornal com trinta anos.

O realizador Roar Uthaug diz que fez o seu primeiro filme de machadada no oitavo ano, mas desde 2002 que se dedicava a vídeos musicais e anúncios. O regresso às origens não se provou astucioso. E ainda menos o facto de terem sido precisas cinco cabeças (entre elas a de Uthaug) para magicar esta história. Para quem está habituado a icónicos assassinos mascarados que não abrem a boca, este também não tem grande presença; é alto, mas magro. A sobrevivente regressa na sequela, com estreia prevista para Outubro de 2008, com outro realizador.

Fritt Vilt 2006

Piranha 2 O Peixe Vampiro, de James Cameron


Em 1978, o realizador Joe Dante realizou Piranha, um filme de terror onde cardumes de peixes devoradores atacavam uma estância balnear. O filme funcionava igualmente como paródia ao sucesso internacional de Tubarão (1975), tanto mais que os diversos cartazes promocionais eram semelhantes aos do filme de Steven Spielberg, apenas substituindo o tubarão por uma piranha gigante (ou várias, dependendo do poster). As piranhas tinham cara de Gremlin, filme assinado por Joe Dante seis anos depois. A Universal Pictures ameaçou processar a New World de Roger Corman (produtor dePiranha) por plágio, mas Spielberg gostou tanto de Piranha que o processo judicial foi abandonado. O filme viria a ganhar dois prémios Saturn em 1979, da Academy of Science Fiction Fantasy & Horror Films, incluindo Melhor Filme de Terror.

Após uma curta metragem de 12 minutos intitulada Xenogenesis(1978), em tempo de curso, James Cameron teve a sua primeira experiência na longa metragem com Piranha Parte 2, quando o primeiro realizador foi despedido pelo produtor executivo Ovidio G. Assonitis. James Cameron tinha sido inicialmente contratado apenas para supervisionar os efeitos especiais. Ao fim de uma semana de rodagem, discussões entre o produtor e Cameron determinaram que este viesse a ser proibido de ver o resultado das suas próprias filmagens e que a montagem se tenha processado à sua revelia. Supostamente, terá sido neste período que James Cameron terá adoecido, e a arder em febre sonhou o argumento de Exterminador Implacável (1984).

Apesar de James Cameron ter rescrito parte do argumento, a pressão de Ovidio G. Assonitis, que supervisionou as filmagens e a montagem, Piranha 2 é inane. Incapaz de atingir um único momento de suspense ou medo, fica-se por meia dúzia de ridículas e mal articuladas piranhas voadoras a atacarem figurantes isolados e uma festa na praia. As piranhas parecem papagaios voadores com as asas a baterem ao vento e vêm-se apenas algumas décimas de segundo de cada vez. Uma piranha, alojada dentro de um cadáver que é levado para a morgue e guardado numa arca frigorífica, pisca o olho a uma das cenas clássicas de Alien (1979), quando horas mais tarde sai do corpo e ataca quem a incomodou. Curiosamente, o peixe é tão grande que seria impossível ter sido transportado oculto dentro do cadáver. James Cameron viria a dirigir em 1986 a sequela, Aliens.

De banalidade em banalidade, o filme atinge o limiar da insuplantável falta de lógica da cena climática, em que uma instrutora de mergulho e um engenheiro bioquímico enchem um barco naufragado com dinamite, sendo que os detonadores foram previamente acertados para que a explosão se dê dentro de quinze minutos e o local está deserto. Sem que façam nada para atrair as piranhas, estas regressam todas a tempo de irem convenientemente pelos ares. É o que dá guiões escritos na casa de banho, efeitos especiais de garagem e realizações com cozinheiros a mais. Um festival de amadorismo trash.

Piranha Part 2 The Spawning