Sunday, May 31, 2009

As Ruínas, de Carter Smith

Scott B. Smith (argumentista de A Simple Plan, de Sam Raimi) teve já o elogio de Stephen King, que chamou a As Ruínas de melhor livro de terror do século XXI. A estreia cinematográfica do fotógrafo de moda Carter Smith (não é familiar do escritor), também merece elogios. Convencional no sentido clássico, é um filme honesto, simples e criativo, capaz de sintonizar um ambiente de inquietação e mantê-lo consistentemente.
Quatro amigos (seis jovens no total) envolvem-se numa situação má, com tendência para piorar, quando se embrenham na selva mexicana para subirem a um templo maia que não consta de nenhum mapa. À chegada, são instados a afastarem-se por locias bastante exaltados. Optando por fugir para o templo, dá-se início a um cerco, em que não se sabe o que é pior, se a polulaça armada se os terrores que o templo encerra.
Jonathan Tucker é um nome em crescimento, não só muscular mas também neste género cinematográfico. Era um miúdo enfezado quando assistiu ao suicídio das virgens de Sophia Coppolla, mas a sua revolta já se manifestara contra o xérife canibal do remake de Massacre no Texas. A par dele e de Jena Malone (Donnie Darko, Life As A House), outros nomes sem peso não desmerecem o respectível salário.
Ben Stiller, cujo nome aparece como produtor executivo, explicou a sua participação por ser amigo do novelista Scott B. Smith. A banda sonora está a cargo de Graeme Revell, prolífico compositor que tem passado por baixo do radar nos últimos anos.

The Ruins 2008

The Poughkeepsie Tapes, de John Eric Dowdle

Falso documentário sobre um serial killer nunca apanhado pelas autoridades norte-americanas, conta com a reconstituição de alguns dos crimes e entrevistas a intervenientes da investigação, mas o elemento decisivo do projecto seria o espólio de cassetes de vídeo encontradas em casa do criminoso. Essas fitas, que dão título ao filme, em vez de chocantes, dão uma pálida ideia do amadorismo do autor, John Eric Dowdle, que escreveu, realizou e editou um autêntico sub-produto da cultura veoyeurista do mais simplório possível.

O que poderia ter sido uma mera justificação para que uma equipa de efeitos especiais caseiros desse a conhecer os seus méritos num festim gore é, afinal, uma envergonhada amostra de cenas discretas e mal montadas, recorrendo permanentemente a uma imagem distorcida, granulada e com desajustes na cor. Os fragmentos dos monólogos dos agentes do FBI, técnicos forenses, familiares e vizinhos das vítimas, não são credíveis no seu conjunto, tão desequilibradas são as prestações dos actores.

Sem a menor exigência ao nível narrativo, de direcção ou representação, não é de admirar que a banda sonora, de um assalariado músico de estúdio (Keefus Ciancia), soe a minimalismo industrial num sintetizador para crianças. Não surpreende, também, que o filme seguinte de Dowdle seja um apressado remake (Quarentena, 2008) de um filme de terror espanhol (Rec, de 2007), filmado de câmara ao ombro e recriando cada cena sem vivacidade ou suspense.

The Poughkeepsie Tapes vive do hype criado em seu redor por uma campanha de marketing que aprendeu com O Projecto Blair Witch, mas com um produto que não lhe chega aos calcanhares. E o mais cómico é que os envolvidos tentaram, durante o período em que o filme batia os festivais de cinema, fazê-lo passar por um verdadeiro documentário. Para além de os actores não serem convincentes (então o pacóvio que diz que viu todas as cassetes e ficou muito impressionado é o cúmulo da incompetência), as gravações do assassino são muito pobres e o twist final traduz-se num enxerto muito mal concebido (julgamento/execução/twist). O mais curioso, porém, não se encontra no filme,mas na realidade: a actriz que representa a principal vítima de tortura e humilhação é casada com o realizador (Stacy Chbosky).

The Poughkeepsie Tapes 2007

Donkey Punch, de Oliver Blackburn

Três jovens inglesas à procura de diversão no sul de Espanha dão por si num pequeno iate com quatro desconhecidos e uma amiga viva a menos. É então que a falta de um argumentista se torna evidente e a partir daí tropeça-se na banalidade de um suspense previsível e entediante.

Escrito e realizado por Oliver Blackburn, Donkey Punch é um pequeno refogado de clichés e personagens estereotipados, que se comportam de modo irrealista até sobrar apenas um. De acordo com o manual de instruções que já vem dos teen slashers dos anos 70, se houver uma rapariga a bordo que é mais responsável e menos libertina que as outras, não custa muito perceber-se quem sobreviverá.

Em conclusão, o realizador sabe o que fazer com uma câmara, tanto em termos técnicos como na escolha dos cenários (o Mediterrâneo foi filmado na África do Sul), mas falta-lhe um argumento credível, personagens interessantes e há muito menos sexo e sangue do que o menu apontava. Originalidade também não.

Spoilers: quando uma das jovens morre, decidem atirá-la borda fora, mas esquecem-se que, se alguma vez for encontrada, não terá água nos pulmões, caindo assim por terra a teoria de afogamento. A cena que envolve um sinalizador marítimo e um espantalho, a piscar o olho a Calma de Morte (1989), de Philip Noyce, é de uma incompetência que raia o desenrascanso grosseiro. Tão absurdo como no filme Armadilha Em Alto Mar, alguém decide que não aguenta mais e suicida-se. Haja paciência.

Donkey Punch 2008

Mártires, de Pascal Laugier


Um torture porn invulgar, surpreendente, implacável e impiedoso. Doentio e isotérico, vai buscar o seu título à definição grega (testemunha) e não católica (sacrifício por uma causa), ainda que as duas possam, num certo sentido, ter continuidade. Vítimas teria sido uma escolha demasiado banal.

Mártires tem o poder de choque de um filme que começa a matar e só perde alento na recta final, quando também o público está já exaurido e tem de ser alimentado à boca. Apesar disso, e mesmo reconhecendo-se o mérito da constante renovação de elementos, as justificações apresentadas soam demasiado a falso para que sejam entendidas como algo mais do que um estratagema solvente. Fica a indisposição e a repulsa causada pela impotência de assistir ao realismo da violência passiva, com alheamento clínico.

Escrito durante uma depressão pelo próprio realizador, o filme é quase esquizofrénico na construção da primeira parte, dando a ferocidade entretanto lugar à tragédia e à profecia, quando mudam os olhos que contam a história. há uma sensação de Irreversível (2002), como se a vingança viesse no início e a vontade de retribuição no final. A ambiguidade do desfecho, contudo, é dissonante na sua aberração. Em vez de solene, como claramente pretende ser, não funciona como advertência à curiosidade sobre o que se esconde para além da morte, mas como anedota. A menos que adoptemos, aqui, a visão católica de Céu e Inferno. Isto é, aquilo que um mártir vê não é necessariamente o lugar para onde todos irão.

Pascal Laugier estará ao leme do remake de Hellraiser (1987), actualmente em pré-produção e com estreia prevista para 2011, como realizador e argumentista. Claro que muita água poderá ainda passar por baixo da ponte, como os nomes dos realizadores franceses Alexandre Bustillo e Julien Maury (A L’Interior, 2007) afastados das mesmas funções pela Dimension Films, o estúdio que produzirá o filme, agora entendido como um reboot e não como um remake.

Martyrs 2008