Thursday, February 14, 2019

The Nightbreed: Director's Cut, de Clive Barker


Há filmes que não melhoram com a idade e textos que começam assim nunca acabam bem. Infelizmente, tal como Tobe Hooper só teve fôlego para uma obra-prima (Texas Chainsaw Massacre, 1974), Clive Barker esgotou o seu talento de cineasta com Hellraiser (1987). Hellraiser II (1988) teve luz verde ainda o original estava em pós-produção e Barker, escritor publicado e realizador de Hellraiser (baseado no seu livro A Hellbound Heart) traçou-lhe as directrizes, mas ao leme ia outro realizador e rapidamente outro argumentista, pois a visão de Barker escolhia Julia (a personagem feminina que, corrompida pelo desejo, atraía vítimas para que o seu amante ressuscitasse, a ressuscitar ela própria em Hellraiser II) como mascote da franchise e, desde a estreia de Hellraiser, Pinhead provou ser mais popular.

Por essa ocasião, já Clive Barker publicara Cabal: The Nightbreed (1988) e adaptara o texto ao grande ecrã. Era a história de um choque entre duas culturas antagónicas dentro do género de terror: o slasher, que na década de setenta e oitenta tinha esfaqueado o seu caminho rumo ao pódio dos anti-heróis (com os porta-estandarte Michael, Jason e Freddy) e o clássico monstro mitológico, entretanto relegado para segundo plano. Mas, de boas intenções está o Inferno cheio e o antecipado Nightbreed (1990) defraudou até as expectativas mais reservadas, desiludindo todos quantos tiveram olhos para distinguir realidade de esperança: o filme não era uma transposição fiel do livro, do guião inicial nem da banda desenhada publicada para alimentar uma procura que nunca chegou. Era uma coisa diferente, grotesca, mal urdida e encaixada à pressa, uma modesta encenação paroquial que trocou o Conto da Natividade pelo de Cabal, incapaz de interpretar as palavras ou entender as motivações, caricaturas sem coração por baixo as próteses e da maquilhagem, cenários medíocres e pinturas matte que não criam a ilusão, facas feitas de plástico, criações em vergonhoso stopmotion e outras marionetas desmotivantes. 

Clive Barker convidara Bob Keen para trazer as criaturas à vida, Ralph McQuarrie para pintar o que não podia ser recriado e Danny Elfman para compor o que só podia ser ouvido. Com um contrato para três filmes, sonhava com uma trilogia e o orçamento de onze milhões de dólares serviu para ocupar três armazéns da Pinewood Studios. A rodagem terminou no segundo trimestre de 1989 e a estreia estava agendada para o verão desse ano, mas a história de amor entre uma mulher e o seu namorado morto e os monstros que viviam por baixo do cemitério serem mais humanos do que os seus congéneres à superfície não correspondeu à expectativa do estúdio.

A antipatia aumentou face à confusão das audiências de teste e o alarme soou. A narrativa distanciou-se dos protagonistas e centrou-se num antagonista periférico mas próximo do slasher de pacote ambicionado para salvar o desastre, misturando os polícias da terrinha com uma multidão de linchadores anónimos que parecem surgir do nada com armamento topo de gama, que depois desbaratam ou não chegam a usar. Foram feitas novas filmagens e substituiu-se o editor de montagem por um que vinha de Terminator (1984), Rambo II (1985) e Comando (1986), pronto a truncar e apressar o que precisava de arejar como um vinho velho. Das iniciais duas horas e meia, a fita passou a bater nos 102 minutos.

Face ao fracasso financeiro e crítico que se seguiu à estreia, o promissor Barker perdeu a compostura e acusou as orientações do estúdio na montagem e na promoção, que lhe deturparam o conceito, a mensagem e o objectivo. Saíram bandas desenhadas e jogos para computador antes do título ser enterrado como um projecto ambicioso que não cumpriu as expectativas e foi preciso chegar a 2012 para que a curiosidade voltasse. Em 2009, tinham sido encontradas versões em VHS de 145 e 159 minutos de duração e um novo trabalho de restauro e montagem permitiu expor em festivais e convenções a visão mais fiel aos desejos do autor, que se intitulou The Cabal Cut. Em 2014, a Shout Factory reeditou o que ficou conhecido como The Nightbreed Director's Cut, ao qual foram retirados 20 minutos da edição comercial e introduzidos 40 minutos novos. Aparentemente, o resto da Cabal Cut não estava em condições de ser aceitavelmente restaurado.

O veredicto? Os actores continuam estáticos, os cenários constrangedores, os efeitos especiais modestos e o que não deixou de ser um brilhante livro de fantasia sombria permanece um filme a evitar. O que pretendia ser uma crítica ao género slasher acaba por manter duas cenas de Decker a matar que não acrescentam nada à narrativa e acabam por revelar-se ilógicas, porque o serial killer de carne e osso parece esfumar-se no ar para aparecer atrás das vítimas, impossível ter passado por elas sem se teleportar. Boone, o herói, continua a comer restos e Lori, a namorada dele, a não saber para que lado voltar-se. Fica agora claro quem são os heróis e quem os vilões e David Cronenberg, que não fazia mais do que cameos nos seus próprios filmes, parece o único actor profissional do elenco. 

No carnaval das almas, os habitantes de Midian vivem em comunidade por baixo do cemitério e a apenas meia dezena deles tem direito a falar, os outros limitam-se a viver sem privacidade em cavernas sem portas ou cortinas, mais parece um expositor num museu de cera. É um épico com qualidade Troma, onde até os duplos parecem ter medo de magoar-se, e uma banda sonora desajustada, daquele tempo em que Danny Elfman fazia tudo soar a variações de Batman(1989), como é o caso da sua outra partitura do ano, Darkman (1990), e de Army of Darkness (1992).

The Nightbreed Director's Cut 1990 (2014)

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