Thursday, February 14, 2019

Split, de M. Night Shyamalan

Depois de anos a tropeçar na anedota em que se tornou, M. Night Shyamalan volta finalmente a equilibrar-se. Se A Visita (2015) mostrava que sabia reembrulhar presentes (o guião era tudo menos original), Split dá-nos um twist final que obriga a reanalisar toda a película. E essa era, para quem ainda se lembra, a imagem de marca do realizador que nos fez ver dead people (O Sexto Sentido, 1999).

É que (SPOILER), por causa do epílogo, em vez de um thriller sobre um homem com múltipla personalidade que sequestra três adolescentes numa cave com o intuito de oferecê-las à nova personalidade, que nomearam de A Fera, trata-se da origin story de um vilão para o inquebrável Bruce Willis poder dizer Esta é uma missão para o Super-homem. Neste sentido, trata-se também de uma sequela de Unbreakable (2000) e não de uma simples sequela directa, mas uma espécie de 1.5, porque os filmes têm um herói em acção e este é sobre o oponente, antes do herói entrar em acção. Prepara o terreno, digamos assim, para um Unbreakable 2 (que até já foi anunciado por Shyamalan, a intitular Glass, com os principais protagonistas e antagonistas de Unbreakable e Split).

O que dizer de Split sem o epílogo? É um thriller com o poder de cativar a atenção pela sua intensidade narrativa e ponderação cinematográfica, oferece uma grande interpretação de James McAvoy (facilitada pelo facto de, das vinte e quatro personalidades do seu personagem, só ter tido de desenvolver nove) e conta com três adolescentes baixinhas e roliças, o que é contra-tipo neste género de produções, mas não demasiado – afinal, não são gordas nem feias (é o terceiro thriller de Anya-Taylor Joy em dois anos, depois de The Witch e Morgan). Mas a mais-valia é mesmo o epílogo, porque a resolução do conflito central é insatisfatória, com a personalidade da Fera a desistir da sua última vítima por esta ter cicatrizes de auto-mutilação e vê-la, nesse sentido, como imperfeita (ou igual a ele, dependendo da argumentação).

Aqui, não deixa de ser importante ter consciência de que a sobrevivente é uma vítima silenciosa de abuso desde tenra idade, revelada pela comunicação das analepses com o facto de ainda morar com o tio abusivo. As suas reacções perante o sequestrador, que inicialmente pensamos vir dos ensinamentos do pai durante as expedições de caça, são afinal um espelho das suas vivências com o tio substituto parental. 

Seja como for, cabe referir que o protagonista (ou antagonista, se a vítima que escapa lhe roubar o título) se baseia no real Billy Mulligan, homem com 24 personalidades e que, acusado de três violações, foi absolvido por não poder ser responsabilizado pelo crime praticado por 1/24 dele.

Split 2016

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