Thursday, February 14, 2019

Halloween, de David Gordon Green

Há datas que cheiram a dinheiro e o 40º aniversário de Halloween há muito que devia estar marcado no calendário de quem se lamentava desde que Rob Zombie (2007) não fez o que prometeu. Talvez por isso, agora, tenham escolhido um realizador com o nome Green, a cor das notas de dólar. Mas David Gordon Green é daqueles profissionais que não saem do amadorismo, intitulam-se indies porque os orçamentos não esticam e terror é coisa que nunca fez, porque tédio é mais o seu registo. De forma calculista, o produtor Jason Bloom fez circular que John Carpenter, realizador do original (1978), estava associado ao projecto, mas a bolha de esperança começou a verter assim que ficou claro que o envolvimento de Carpenter se cingiria a um título honorário de produtor executivo e algumas dedadas num teclado que partilhou com os filhos, Cody Carpenter e Daniel Davies, banda sonora a três porque nepotismo ou nada. O seu contrato ainda tinha o chavão consultor criativo, mas aí já foi apanhado a dormir. Tanto mais que nem abriu um olho quando Danny McBride co-assinou o guião com Green.

Halloween (2018) é um filme tão serviçal e derivativo quanto o seu título (até Halloween H40 teria sido mais respeitoso), uma espécie de vira o disco e toca o mesmo, mas com o disco tão riscado que às vezes toca para trás. Diálogos cansados, trama preguiçosa e um vilão que continua o mesmo autómato pré-programado que não encontra obstáculos e tem um GPS para ir de actor em actor, sem que se perceba como é que atravessa distâncias ou se orienta.

Ao contrário de Halloween H20 (1998), Laurie Strode, a endgirl do original, não é irmã de Michael Myers (o assassino mascarado de Capitão Kirk afinal matou ao acaso em 1978), nem teve um filho (Josh Hartnett) que sobreviveu ao ataque de Myers quando tinha 17 anos, a mesma idade que a mãe quando foi assediada pelo irmão que a achava demasiado viva para o seu gosto. Desta vez, porque assim determinam os tempos, Laurie Strode está de volta com um exército de mulheres, é a filha e a neta, que a genética da famíla Strode assim o determinou. Só é pena que a filha não seja mulata e a neta latina, por influência dos respectivos pais, mas girlpower e diversidade era, aparentemente, activismo a mais. Jamie Lee Curtis regressa porque o século XXI lhe tem posto pouco pão na mesa e ela não tem outro papel que a mantenha relevante, Judy Greer porque é preciso alguém com quem se embirre à primeira vista e Andy Matichak porque o dinheiro para salários não deu para três gerações de rostos identificáveis.

Com personagens de cartão e um vilão de papel de parede, Halloween comemora os 40 anos sem trazer qualquer novidade, é um simples baralhar para tornar a darMichael Myers tem agora cabelos brancos, passou a vida inteira num hospício e, desde a morte de Samuel Loomis, o seu pedopsiquiatra, passou para as mãos de outro que tem uma curiosidade mórbida sobre o estado da maldade pura que se esconde por trás do serial killer mudo (será factor relevante para a fuga do assassino, mas é material de cartilha sem honras para além da nota de rodapé, é a técnica da atitude inversa, a excepção que confirma a regra). É 31 de Outubro, Michael Myers vai até Haddonfield (a mesma vilória onde matou em 1978), ali mesmo ao virar da esquina do local onde virou o autocarro que iria levá-lo de um hospício a outro, e começa a matar de porta em porta. Até que se cruza com Laurie Strode, que lhe tenta dar uns tiros mas erra, treinou a vida inteira para este momento e falha, o filme quer exultar o girlpower, mas Laurie já está entradota e o grannypower não é tão bom. Mas ela tem uma quinta cercada de arame farpado, na qual se preparou para a vingança toda a vida, mas se esqueceu de montar armadilhas para além de uns holofotes no telhado e uma sala de pânico na cave da vivenda. Também não comprou metralhadoras, o que é perfeitamente legal nos EUA, porque um vilão invencível como Michael Myers se mata muito melhor com uma caçadeira que tem de ser recarregada à mão de dois em dois tiros, ironia dirigida aos argumentistas que não viram Terminator 2 (1992), onde Sarah Connors, a endgirl do original, treinava com uma muito mais variada gama de armas automáticas e de alto calibre para o dia em que uma máquina implacável viesse reclamar-lhe novamente a vida ou a do filho. Dinheiro teve para encher a casa e o quintal de manequins de loja, a pensar no dia em que quisesse matar Myers e este se pudesse misturar com as estátuas para confundi-la.

Halloween (2018) é pretensioso, aborrecido e boçal. Mas foi barato (dez milhões de dólares) e trabalhou a campanha de marketing, acabando por colher alguns títulos para colocar na prateleira: mais rentável estreia da saga, mais rentável filme de terror com uma protagonista, mais rentável filme com uma protagonista acima dos 55 anos (presumo que o segundo filme nesta categoria tenha uma protagonista de 54 anos), segunda mais rentável estreia de Outubro (Venom ganhou) e segundo mais rentável estreia de terror de sempre (It, de 2017, continua à frente). Mas, louvores financeiros à parte, é um filme para quem não resiste a uma grande desilusão. 

Halloween 2018

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