Bem-vindos à terra onde as vinganças não se improvisam. A fervilhar de visceralidade, esta é a narração da história de um homem que foi aprisionado durante quinze anos num quarto de hotel sem janelas, a mando de um desconhecido e, quando libertado, busca vingança e respostas, indeciso sobre qual quer com mais intensidade. O responsável não se acanha e propõe um jogo do gato e do rato com temporizador. Vencedor do Grande Prémio do Festival de Cinema de Cannes em ano presidido por Quentin Tarantino, Oldboy baseia-se na manga japonesa de Nobuaki Minegishi e Garon Tsuchiya e é a segunda parte da trilogia da vingança do realizador sul coreano Chan-wook Park, sendo as outras Sympathy for Mr. Vengeance (2002) e Lady Vengeance (2005).
Violento e surreal, Oldboy tem um impacto singular pela sua composição delirante e pela brutalidade fulminante, terminando com descobertas chocantes e uma glossectomia como tributo ao adversário triunfante mas ainda não aplacado, num crescendo hipnótico que já incluía outras amputações traumáticas, fossem transradiais ou odontológicas, à martelada é que se anda para a frente.
O filme difere da manga inspiradora em diversos pontos. Altera a duração de cárcere de 10 para 15 anos, casa o protagonista e dá-lhe progenitura em vez de uma simples noiva, mata-as para que o evadido seja um fugitivo da justiça após libertação, encurta o prazo da investigação, elimina diversos personagens coadjuvantes, dá vontade de vingança a quem apenas queria recuperar o tempo perdido, transforma todo o final, tanto na resolução do mistério como as respectivas consequências, e a icónica luta de um contra muitos no corredor do hotel, precursora dos combates corpo-a-corpo de 300 (2006) está ausente. A manga, publicada entre 1996 e 1998, tem cerca de 600 páginas espalhadas por oito volumes, ao passo que o filme apresenta uma urgência exponenciada pela sua limitação temporal, fatais prazos a cumprir com os quais a manga não contendia, já que nela o protagonista não era fugitivo e regressava a uma vida normal, na construção civil, antes de começar a ser assediado pelo antagonista para que se dedicasse ao puzzle que lhe interrompera o destino por uma década. A razão para o encarceramento, capaz de abrir brechas na sanidade do protagonista já instável pela experiência, também difere no filme, sendo angustiante e frenética, ao contrário da patetice que desiludia na manga, a fazer, eventualmente, sentido para as sensibilidades nipónicas.
Chan-wook Park não poupa esforços para que a viagem seja alucinante e a fúria com que se transporta é uma força da natureza. Grande parte da investigação do protagoonista é intuitiva e apresentada de uma forma quase surrealista, obrigando o espectador a estar atento e a fazer a sua própria interpretação daquilo que lhe é transmitido com falhas, porque o protagonista é impelido pela raiva e esta cega. Mas, no fundo, trata-se de compreender que não se escapa ao karma, ser fala-barato tem repercussões e o resultado para o egoísmo serve-se frio. Choi-Min-sik é o actor perfeito para estrelar esta loucura multi-premiada e que conta já com um remake não oficial indiano (Zinda, 2006) e um remake norte-americano desejado por Steven Spielberg em 2008, antes de abandonar o projecto que acabou nas mãos de Spike Lee (Oldboy, 2013).
Oldboy 2003
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