Escrito e realizado pelo estreante Oren Peli, Actividade Paranormalnão passa de um pequeno embuste. Vendido como peça de terror, vive da expectativa de algo que nunca se confirma, exigindo um público extremamente sugestionável para que não se veja aquilo que realmente é: um aborrecido pseudo-documentário sobre um assombramento.
Convém referir que, neste momento, há duas versões do filme. Rodado em apenas sete dias, na casa do próprio realizador, a película foi exibida em diversos festivais americanos (o primeiro dos quais o Screamfest Horror Film Festival; o Festival de Sundance não o aceitou) e DVD screeners enviados para inúmeras distribuidoras. Steven Spielberg teve acesso a um desses DVDs, viu-lhe potencial e propôs à Paramount adquirirem os direitos e efectuarem um remake. Eventualmente, o que acabaria por ocorrer seria uma remontagem com menos 10 minutos de duração (inicialmente tinha 97 minutos) e a substituição do clímax por outro totalmente distinto.
O polimento cingiu-se ao encurtamento de diversas cenas (um segundo aqui, um segundo ali), a introdução de duas cenas inúteis (a descoberta das chaves da rua no meio do chão da cozinha é uma delas) à qualidade da imagem das cenas pior iluminadas (o casal a dormir no quarto às escuras) e ao departamento sonoro, com os ruídos incrementados ou suavizados, conforme o efeito pretendido. O final da história é que, rodado de novo, surge tão radicalmente alterado que o ênfase é diametralmente oposto. Infelizmente, ambas versões são risíveis.
A história é básica: Katie e Micah são um casal apaixonado com um problema. Ela, quando tinha oito anos, era assombrada por uma criatura que ficava aos pés da sua cama a olhar para ela. Em várias fases da sua vida, e em casas diferentes, sentiu essa presença malévola. Uma vez que a mesma se manifestou agora mais insistentemente, Micah decide comprar uma câmara para documentar as aparições. Durante a noite, a câmara é colocada num tripé, com vista privilegiada sobre o quarto de cama e o corredor. Apesar de fazer imenso barulho, bater portas e acender a luz uma vez, a presença nunca chega a ser uma manifestação corpórea. Ainda assim, o casal vai-se tornando mais nervoso e desequilibrado, especialmente pela falta de sono. Um tabuleiro de ouija pega fogo, mas apaga-se sozinho (o que é bom, porque o realizador não tinha seguro para o recheio do imóvel); um vídeo caseiro mostra um exorcismo pindérico e anedótico, que foi escurecido e encurtado na versão comercial de cinema; descobre-se no sótão uma foto ligeiramente queimada de Katie aos oito anos, foto que não deveria existir e deve ter caído do bolso das calças da entidade, provavelmente roto para além de invisível. Esse é um dos grandes defeitos do filme, baixo orçamento ou não: em ocasião nenhuma é investigada a razão pela qual o demónio se terá centrado em Katie ou que ligação tem com ela (existe e pronto, independentemente de ela não ser visual nem intelectualmente estimulante). Quanto aos finais, desenvolvê-los ei num parágrafo isolado, que conterá, naturalmente,spoilers.
A versão original terminava com Katie a descer as escadas (a câmara apenas filma o quarto, o resto serão apenas efeitos sonoros), a gritar, Micah vai atrás dela, gritos e barulho, silêncio, Katie regressa ao quarto com uma faca de cozinha e a camisa ensanguentada, senta-se no chão a baloiçar o tronco catatonicamente, passa-se um dia inteiro sem que mude de posição, a amiga vem visitá-la (já tinha deixado uma mensagem no voice mail) e desata a gritar (supõe-se que terá visto o cadáver de Micah no rés do chão), a polícia é chamada e abate a tiro Katie quando esta se aproxima ainda de faca na mão. No final alternativo, após os ruídos no rés-do-chão, entre Katie e Micah, esta regressa ao quarto com ele nos braços, projecta-o contra a câmara e depois, com uma expressão demoníaca, atira a própria cara contra a objectiva. Num ecrã negro, é veiculada a informação de que Katie nunca foi encontrada. O realizador já informou haver ainda um terceiro final, no qual Katie corta a própria garganta com a mesmo faca que matou Micah. Venha o Diabo e escolha.
Foi Steven Spielberg quem impulsionou esta mudança de auge, que distingue assim a versão realista (Katie mata Micah de forma confusa, mas credível) e a versão sobrenatural (Katie parece ter sido possuída pelo demónio e apresenta uma agressividade sobre-humana) exibida nos cinemas.
Oren Peli serviu-se de uma única câmara de vídeo, transportada à mão ou em tripé pelos protagonistas, método utilizado até à exaustão entre 2006 e 2007, ano de Cloverfield, Rec (americanizado em remake relâmpago com o título Quarentena), The Poughkeepsie Tapes, Alone With Her, Diário dos Mortos e até Brian DePalma se apaixonou pelo método no lamentável Censurado. A moda foi lançada por O Projecto Blair Witch (1999), mas já aí era um plágio do obscuroO Último Registo (1998). Pagou aos dois actores 500 dólares cada e já se fala que é o filme mais rentável de sempre, ao custar 15 mil dólares (sem contar com a promoção) e ter arrecadado lucros de bilheteira superiores a 100 milhões. Apesar do hype em seu redor,Actividade Paranormal é um exemplo de amadorismo atroz, cujo único mérito é o da antecipação, a forçar a audiência a olhar para um ecrã onde nada acontece e tentar fazê-la sentir que vê alguma coisa. Mas tal funciona apenas ao nível formal, porque emocionalmente é incapaz de absorver o cinéfilo. A Paramount, na dúvida, assegurou já os direitos de uma possível sequela.
Paranormal Activity 2007