Depois Da Vida é a primeira longa metragem de Agnieszka Wojtowicz-Vosloo, realizadora polaca formada na Universidade de Nova Iorque e cuja curta de apresentação foi o multipremiado Pâté.Depois Da Vida é uma proposta intrigante e plena de possibilidades mas, no conjunto, lamentavelmente frustrante. A assinar a co-autoria do argumento com o marido, ela terá de identificar-se com as promessas não cumpridas, especialmente ao nível da história. Apesar das implicações, não há ingredientes sucientes para a duração proposta.
Com pretensões de thriller psicológico, o filme exibe como cenário preponderante o interior de uma casa mortuária, durante o período que separa a morte de uma professora de escola e o seu enterro. O ambiente é esteticamente estirilizado, frio e impessoal, a apostar muito na decoração de interiores e na competente direcção de fotografia. O ritmo é atmosférico e tão lento que parece suspenso. O poder de representação é reduzido a três actores: Liam Neeson, Christina Ricci e Jason Long. Neeson é imperscrutável na figura do agente mortuário, à conversa com os cadáveres deitados na marquesa, enquanto os prepara, veste e maquilha para as respectivas exéquias. Christina Ricci deita-se na marquesa e recusa-se a acreditar que está morta. Justin Long é o namorado de Ricci, incapaz de aceitar que a perdeu.
Não é um filme previsível e reconhece-se que é intrigante. A par da aparente evidência da morte da professora, são muito subtilmente dispersas pistas que apontam para a actividade de um meticuloso assassino. O agente mortuário invoca-se o poder de auxiliar as almas na transição para o pós-vida, de ser capaz de ouvi-las e sossegá-las para o inevitável. A sua actual paciente enfrenta um natural estado de negação, chegando a fazer algumas tentativas pouco convincentes de fuga, até finalmente resignar-se, vindo mais tarde a agarrar-se à possibilidade de tudo não passar de um equívoco. No fundo, todo o filme ciranda em redor de uma única questão: estará ela viva ou morta? Será o agente funerário um médium ou um serial killer?
Muito mais do que a história, que avança a passo de caracól, Depois Da Vida capitaliza no factor necrófilo. Christina Ricci é conhecida do público desde criança, primeiro como filha de Cher (A Minha Mãe É Uma Sereia, 1990), depois como filha dos Adams (A Família Adams, 1991) e amiga do fantasma simpático Casper (1995). Tornou-se atrevida em A Tempestade de Gelo (1997) e O Oposto de Sexo(1998), mas o corpo demasiado adiposo falhava em colocá-la nas capas das revistas de entretenimento. Após uma dieta consistente, apresentou uma atraente nudez em Prozac (2001), mas o seu peso continuava a apresentar questionáveis flutuações. Elegante na sérieAlly McBeal (2002), mas mais rotunda em Monstro (2003) e A Vida E Tudo O Mais (2003). Black Snake Moan (2006) estabeleceu-a inegavelmente como bomba sexual, a transpirar sensualidade em vestes reduzidas. Depois Da Vida apresenta-a etérea, nas suas formas petites de vespa, mergulhada em maquilhagem que simula a lividez e lhe cobre as sete tatuagens. Completamente nua em pelo menos metade da sua actuação, Ricci encarna poses que incendeiam a frieza do cenário e hipnotizam a cada gesto.
Claro que uma actriz viva e que se move e fala não é verdadeira necrofilia e não há mal nenhum em desejá-la. A curta metragem de Nacho Cerdà, Aftermath (1994), será ideal para compreender-se a diferença. Noutras semelhanças, cabe referir que enterrar alguém vivo está longe de ser novidade. Desde a primeira adaptação do conto homónimo de Edgar Alan Poe, há mais de uma dezena de títulos idênticos e a série Hitchcock Apresenta também não lhe foi estranha (episódio Final Escape, em 1964 e com remake em 1985). Talvez a variação mais criativa tenha sido O Homem Que Queria Saber (1988), que o holandês Georges Sluizer reproduziu em americano em A Desaparecida (1993). Quentin Tarantino foi outro que gostou tanto da ideia que a utilizou no Vol. II de Kill Bill e a repetiu no último episódio (duplo) da quinta temporada da série CSI, enterrando o personagem Nick Stokes. A contrário, há também filmes com personagens que supomos vivos e se revelam mortos. Entre eles, os mais notáveis serão BZ- Viagem Alucinante (1990) e O Sexto Sentido (1999).
Em suma, Depois Da Vida tem qualidades, mas peca por uma direcção macilenta, a injectar pistas demasiado a conta-gotas. A ambiguidade é mantida até ao final e essa irresolução tem mão tão pesada que se torna indigesta. A inércia é apenas contrabalançada pela beleza de Christina Ricci, mas há limites para o transe que esta é capaz de provocar.
After.Life 2009
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