Transportando o espectador consigo por ruas viciosas até às suas próprias vítimas, onde executa jogos de assédio, perseguição e escalpelamento, Maníaco é um tour de force para o realizador Frank Khalfoun ou, mais propriamente, para o director de fotografia Maxime Alexandre, que eleva o conceito de POV a um novo patamar. Se isto, em si, não é novo, uma vez que o filme original (Maníaco, 1980), abria precisamente com uma longa cena utilizando esse método (inspirada na aproximação furtiva dO Tubarão, 1975), o remake estende a técnica a toda a película.
Joe Spinell era um actor com um sonho e, inspirado no sucesso de Sylvester Stallone (de cujo filho foi padrinho), levou o seu guião a um realizador, com a condição de ser ele a representar o protagonista. Não era a história de um boxeur (Spinell contracenou com Sly em Rocky, 1976), mas de um psicopata violento, e William Lustig podia ser inventivo, mas o seu currículo era pornográfico. Entre ambos e dois investidores (um dos quais colocou a condição da esposa ser a heroína), juntaram dinheiro suficiente e conseguiram chocar o público e a crítica, nomeadamente através da explosão de um modelo de silicone da cabeça de Tom Savini (responsável pelos económicos efeitos especiais). Spinell tentou até à sua morte financiar uma sequela, enquanto Lustig aproveitou o empurrão para enveredar pelo género, dirigindo a trilogia Polícia Maníaco (1988-93) antes de trocar a realização pelo restauro de clássicos pouco conhecidos para o mercado de vídeo.
A dupla de argumentistas Alexandre Aja e Grégory Levasseur, que assinaram Alta Tensão (2003) em França e rumaram aos EUA para um curto reinado com o remake de The Hills Have Eyes (2006) e Mirrors (2008). Escreveram P2 (2007) para Frank Khalfoun, que foi actor em Alta Tensão e agora bisa atrás das câmaras. Excepcionalmente, é um remake que não envergonha os envolvidos. Se algo não funcionava em Maníaco (1980) era a história, como se Spinell tivesse trabalhado o personagem e esquecido o resto. Centrava-se num indivíduo que matava mulheres e conversava com os manequins de loja que tinha em casa, depois de lhes agrafar os escalpes das vítimas, mãe morta que estais no céu e me alucinas na Terra. A meio da película, porém, o introvertido conhecia uma fotógrafa de moda, com a qual saía algumas vezes, antes de decidir mostrar-lhe a campa da mãe, tentar matá-la, ser agredido e ir a falar sozinho até casa, onde os manequins o desmembravam e a polícia o encontrava não se sabe porquê. Literalmente. E, tendo em conta o aspecto ranhoso de Spinell e o cosmopolita de Caroline Munro (a esposa do produtor que mais contribuiu), o interesse manifestado nele soava improvável. A nova equipa lima as arestas de forma coerente, tanto em respeito aos manequins como à fotógrafa e dá um rosto ao maníaco que é menos conspícuo. É certo que o pequeno Elijah Wood podia fazer a barba e não vestir blusões de tropa, mas, ainda assim, não é um brutamontes com a cara cheia de bexigas.
Por falar no actor, o resultado final de Maníaco (2013) está tão dependente da sua interacção com a câmara que é assustador. Devido à arriscada escolha de rodar o filme através do olhar do assassino, o rosto de Elijah Wood encontra-se ausente da tela durante 70% do tempo, mas a sua presença foi constante por trás do operador de câmara, fornecendo a altura e os ângulos certos para o posicionamento da objectiva e as mãos que seguram os objectos são as suas (quando foram precisas duas mãos, a esquerda é de um duplo, pois era impossível chegar ao enquadramento com ambas). A sua locução sobre a imagem é outro contributo de peso para nos colocar na mente do protagonista mas, o momento mais bem sucedido do filme é quando, após uma extensa e claustrofóbica sequência de caça, que começa com a sinalização de uma vítima num bailado e termina com a sua morte num parque de estacionamento, a câmara subitamente abandona o corpo do maníaco e o observa de fora, como se fosse possível separar o culpado do inocente, o que se é do que se faz. E, nesse quadro implacável, há esperança. Tal sequência daria uma curta-metragem perfeita.
Maníaco (2013) é, definitivamente, interessante do ponto de vista técnico, não só pelo POV, mas pela efectiva transformação das ruas da cidade num pátio para predadores urbanos. A narrativa é, também, muito mais fluída do que no original. A nudez, ingrediente constante dos sleazy slashers dos anos 1970 e 1980, é servida por Megan Duffy e Genevieve Alexandra, com Nora Arnezeder a desiludir pela castidade, mas a surpreender na representação, corrigida a inexpressividade que a caracterizava em Detenção de Risco (2012) e As Palavras (2012).
Maniac 2013